Septenários (Abellio)

(Abellio1984)

No mesmo sentido, o Sepher Yetzirah, ao descrever a estrutura das sete letras duplas, associa-as, numa forma antropológica paralela à forma cosmológica já mencionada, às sete “aberturas” da cabeça, a saber: a boca, os dois olhos, as duas narinas e as duas orelhas. Ora, se, além da constatação ingênua dessa simples igualdade numérica, atentarmos para as funções desempenhadas por essas sete “aberturas”, notaremos não apenas que essa estrutura é evidentemente a mesma da esfera dos cinco sentidos — sendo o paladar a forma interna do tato —, mas que ela também rege a totalidade de nossa percepção do espaço.

A boca, de fato, pelo paladar e pelo contato dos lábios, governa a percepção imediata dos objetos; os olhos, pela visão, sem outro intermediário além do próprio espaço, nos colocam em relação com os objetos mais distantes do universo; as narinas e as orelhas, por fim, pelo olfato e pela audição, nos colocam, por sua vez, em relação, através do ar e de maneira mais ou menos nítida, com objetos situados a distâncias variáveis, porém limitadas. Vê-se aqui mais uma vez que, mediante uma redução adequada, é possível extrair do antigo texto uma ressonância perfeitamente atual e, assim, imaginar a possibilidade de uma comunhão com seu hipotético autor, que alguns afirmam ser o próprio Abraão.

Dessa forma, as “aberturas” da cabeça são colocadas em correspondência com diferentes categorias de distâncias, e a noção de estrutura única subjacente aos mais diversos objetos que daí resulta é hoje bem conhecida dos matemáticos, para os quais ela constitui a própria base da chamada matemática moderna. É assim que a estrutura de grupo, cuja definição axiomática é bastante abstrata, se realiza concretamente de múltiplas maneiras, muitas vezes muito distantes umas das outras. Entre essas realizações, há algumas eminentemente complexas que governam, por exemplo, em grande parte, disciplinas tão árduas quanto a relatividade e a física quântica, mas, por outro lado, há outras que são quase triviais.

Assim, se o grupo de Lorentz e o das rotações no espaço complexo exigem, para serem plenamente compreendidos, sólidos conhecimentos físico-matemáticos, o grupo dos deslocamentos no espaço, no sentido usual, não apenas é totalmente acessível, como também é praticado diariamente, e os axiomas abstratos da definição dos grupos assumem aqui a aparência mais banal; por exemplo, o fato de que todo elemento de um grupo possui um inverso se traduz, nesse caso, dizendo que a todo deslocamento está associado o deslocamento inverso e que, portanto, ao trajeto de ida Paris-Lyon, por exemplo, está associado o trajeto de volta Lyon-Paris.

O essencial, então, é que os axiomas e as propriedades gerais dos grupos não perdem nada de seu rigor quando expressos nos termos de uma realização tão comum.

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