Havia em Delos, além da pedra cúbica, um outro altar denominado Keraton, inteiramente formado de cornos de bois e cabras solidamente unidos. É evidente que isso se refere de modo direto a Karneios, cuja relação simbólica com os animais de chifres deixou vestígios até nossos dias. A própria palavra corno liga-se claramente à raiz KRN, do mesmo modo que a coroa, que é uma outra expressão simbólica das mesmas ideias, pois as duas palavras (no latim cornu e corona) são muito próximas entre si. É evidente que a coroa é insígnia do poder e marca de uma condição elevada, não sendo pois necessário insistir a respeito. A partir disso já encontramos uma primeira relação da coroa com os cornos, pelo fato de estarem ambos colocados sobre a cabeça, o que representa bem a ideia de “ápice” (ou topo). Há ainda outra coisa: a coroa era primitivamente um círculo ornado de pontas em forma de raios; e os cornos, do mesmo modo, são tomados como representação dos raios luminosos, o que nos leva a certas considerações já expostas no que diz respeito às armas simbólicas. É claro, além do mais, que os cornos podem ser assimilados às armas, até no sentido mais literal, e é exatamente por isso que lhes foi atribuída uma ideia de força ou poder, como de fato podemos verificar em todos os lugares e épocas. A mesma assimilação, naturalmente, é válida ainda para outras armas animais, como as presas do elefante e do javali, cuja forma em ponta é aliás semelhante à dos cornos. Podemos acrescentar, no entanto, que a dualidade de cornos (tal como a das presas) impede que o simbolismo “axial” possa ser-lhe aplicado: ela se aproxima antes, sob esse aspecto, às duas pontas laterais do trishula; é por isso, também, que falamos aqui dos raios luminosos em geral, e não do “Raio celeste”. Seria fácil oferecer múltiplos exemplos, e das mais diversas procedências, em que os cornos são empregados como símbolo do poder, em especial na Bíblia e, de modo mais particular ainda, no Apocalipse.
Convém notar, de fato, que os cornos em seu uso simbólico revestem-se de duas formas principais: uma é a dos cornos do carneiro, que é essencialmente “solar”, e a outra dos cornos do touro, que, ao contrário, é “lunar”, lembrando, aliás, a própria forma do quarto crescente. A essas duas formas corresponde a distinção que os alquimistas fazem em relação ao signo do mercúrio: a forma lunar refere-se ao mercúrio comum e a forma solar ao mercúrio dos sábios. Poderíamos também, a esse respeito, estabelecer as respectivas correspondências entre os signos zodiacais do Carneiro e do Touro. Isso, porém, devido à aplicação que se poderia fazer da predominância de uma ou de outra forma nas diferentes tradições, daria margem a considerações “cíclicas”. (Guénon)