Duns Scot

Duns Scot, John (1266-1308)

Nasceu na Escócia e morreu em Colônia. Conhecido como Doctor Subtilis por sua sutileza e sagacidade. Estudou as primeiras letras nos franciscanos, onde entrou aos quinze anos. Fez estudos de filosofia e teologia em Oxford e Paris. Em 1304, foi nomeado mestre em teologia desta última universidade. Em 1305-1306 voltou a Oxford como professor de língua estrangeira, onde escreveu sua obra principal o Comentário às sentenças, conhecido como Opus Oxoniense. Em 1308 foi chamado a Colônia, onde morreu.

A breve vida de Duns Scot é ocupada toda ela por sua atividade docente e científica. Entre suas obras destacam-se o Tractatus de primo principio; as Quaestiones in Metaphysicam; o Opus Oxoniense ou Comentário às Sentenças; as Reportata parisiensia e um Quodlibet. As três primeiras pertencem à época de sua estada em Oxford; as outras duas são resultantes de seu magistério em Paris. O catálogo definitivo das obras autênticas somente se terá no término da edição crítica iniciada em 1950. A pesquisa moderna prossegue em busca de novas obras. Hoje a crítica considera apócrifas algumas delas.

Convém afirmar que Scot é fundamentalmente agostiniano, como inglês e franciscano. Seu pensamento sente o peso da tradição de Oxford e de sua ordem franciscana, particularmente a dos grandes mestres como São Boaventura.

Seus pontos básicos de repercussão são os seguintes:

— O ponto de partida básico, que o separa de Santo Tomás é: a) O contraste entre a verdade racional da metafísica — própria da razão humana e válida, portanto, para todos os homens — e a verdade da fé à qual a razão pode somente se submeter e que tem uma certeza bem sólida para os católicos, b) A fé não tem nada a ver com a ciência. A fé pertence ao domínio prático. “A fé não é um hábito especulativo, nem o crer é um ato especulativo, nem a visão que segue ao crer é uma visão especulativa, mas prática” (Opus Ox., pról. c. 3).

— Tudo o que ultrapassa os limites da razão humana já não é ciência, mas ação ou conhecimento prático. Daí: a) A separação e a antítese na doutrina de Scot entre o teórico e o prático, b) O teórico é o domínio da necessidade, da demonstração racional e da ciência. O prático, o domínio da liberdade e, por conseguinte, da falta e impossibilidade da demonstração e da fé. c) Em consequência, o fim da teologia não é teórico, mas educativo e prático. A teologia não pode ser chamada ciência propriamente dita.

— De acordo com esse conceito de ciência, Scot considera impossível demonstrar por meio da razão todos os atributos de Deus e, inclusive, a imortalidade da alma. Derruba a tentativa da escolástica, principalmente tomista, de experimentar racionalmente a existência de Deus. “Não se pode provar, demonstrar que Deus vive, que é sábio e inteligente, que é dotado de vontade, que é a primeira causa eficiente etc” (Theoremata, c. XIV, XV, XVI etc.).

— A univocidade, em aberta oposição a Santo Tomás, é característica de Scot. O ser, conceito fundamental e primeiro, não entra em nenhuma categoria: é transcendente. E uma noção unívoca, não análoga, e é comum a todas as coisas existentes: às criaturas e a Deus.

Desse princípio nascem os caracteres peculiares dateodiceia escotista, particularmente de cara as afirmações sobre o problema da cognoscibilidade de Deus, que podemos resumir nestes pontos: a) Os conceitos que a nossa mente forma de Deus não são unicamente negativos nem são apenas análogos, mas positivos, conotativos da essência divina e, em parte pelo menos, unívocos, b) O conceito mais simples e, por isso, o mais perfeito, que a nossa mente pode formar sobre Deus é o de ser infinito, c) Partindo de que o ser infinito é sem causa e necessário, Scot assume o argumento ontológico de Santo Anselmo.

“Se um ser sem causa é possível, devemos concluir, de acordo com o princípio de contradição, que esse ser existe de fato.” Afasta-se assim das vias de Santo Tomás: os feitos a posteriori de evidência sensível empregados por este são substituídos por uma verdade de evidência intelectual.

— Da mesma forma, a doutrina escotista ressalta o primado da vontade sobre o entendimento. E isto em todas os sentidos, para Scot, a vontade: a) não é passiva mas ativa; b) não se determina por uma necessidade; c) sua importância moral é superior à do entendimento. Daí que para ele o amor seja superior à própria fé. “Vale mais amar a Deus do que conhecê-lo. E vice-versa: a perversão da vontade é mais grave do que a do entendimento”.

— Não acaba aqui a doutrina de Scot. Interessante é sua doutrina sobre o conhecimento do singular, os universais, a união da alma e do corpo, o princípio de individualização, o conceito de lei natural, a estrutura do ato moral etc.

— “Sua tentativa de enriquecer a tradição agostiniana com as doutrinas do aristotelismo mereceu-lhe a honra de ser considerado o doutor mais representativo da escola franciscana. No entanto, os pontos fracos e as conciliações superficiais, que frequentemente o fazem oscilar entre Aristóteles e Santo Agostinho, infundem a muitos estudiosos sérias dúvidas sobre a coerência e a solidez intrínsecas de seu pensamento: Aqui reside, mais do que no restante, seu significado histórico e seu valor teórico” (E. Bretton, Diccionario de filósofos).

BIBLIOGRAFIA: Opera omnia. Ed. Wading, 12 vols. Lyon 1639 (Ed. Vives, Paris 1891-1895, reimpresão); Opera omnia. Cidade do Vaticano 1950, em publicação; Obras del Doctor Sutil Juan Duns Escoto, 2 vols. (BAC); Id., Tratado acerca del primer principio. Edição bilíngue, preparada por Félix Alluntis (BAC). (Santidrián)

DIcionário da Idade Média