Em primeiro lugar, foi o descobrimento da existência de uma filosofia, ou melhor, de uma dimensão espiritual hindu que não era nem a da Índia clássica —diríamos a dos Upanixades e do Vedanta; em uma palavra, a filosofia monista— nem a devoção religiosa, a bhakti. Tanto o ioga como a samkhya professam o dualismo: a matéria por um lado e o espírito por outro. Entretanto, não era o dualismo o que me interessava, a não ser o fato de que, o mesmo no ioga que na samkhya, o homem, o universo e a vida não são ilusórios. A vida é real, o mundo é real. E é possível conquistar o mundo, é possível dominar a vida. E ainda mais, no tantrismo, por exemplo, a vida humana pode ser transfigurada mediante os ritos, executados a seguir de uma longa preparação ióguica. Trata-se de uma transmutação da atividade fisiológica, por exemplo, da atividade sexual. Na união ritual, o amor já não é um ato erótico ou um ato simplesmente sexual, a não ser uma espécie de sacramento; exatamente como beber vinho, na experiência tântrica, já não é beber uma bebida alcoólica, a não ser compartilhar um sacramento… Descobri, pois, essa dimensão tão esquecida pelos orientalistas, descobri que a Índia conheceu certas técnicas psicofisiológicas graças às quais pode o homem ao mesmo tempo gozar da vida e dominá-la. A vida pode ser transfigurada mediante uma experiência sacramental. Este é o primeiro ponto. [Mircea Eliade]