literatura

Eliade

É bem sabido que a literatura, oral ou escrita, é filha da mitologia e herdeira de suas funções: narrar as aventuras, contar quanto de significativo ocorreu no mundo. Mas, por que é tão importante saber o que acontece, o que ocorre à marquesa que volta do chá às cinco? Penso que toda narração, inclusive de um fato ordinário, prolonga as grandes histórias narradas pelos mitos que explicam como acessou ao ser este mundo e por que nossa condição é tal como hoje a conhecemos. Penso que o interesse pela narração forma parte de nosso modo de ser no mundo. Responde à necessidade em que nos achamos de entender o que ocorreu, o que fazem os homens, o que podem fazer: os perigos, as aventuras, as provas de toda classe. Não somos como pedras, imóveis, nem como flores ou insetos, cuja vida está traçada de antemão. Nós somos seres para a aventura. O homem nunca poderá renunciar a que lhe narrem histórias.

—A literatura assume as funções do mito. Pode dizer-se que este morre e que aquela nasce com a invenção da escritura?

—Digamos acima de tudo que com este nascimento da literatura aparecem as religiões do Livro. Entretanto, para lhe responder, diria que com a literatura quão único possivelmente desaparece é o universo evidente do mito. Pense nos relatos novelescos da Idade Média, por exemplo, na busca do Graal. O certo é que o mito se prolonga na escritura. A escritura não destrói a criatividade mítica. [Mircea Eliade]

Guénon

Não acreditamos nas “invenções dos poetas”. Tais invenções, longe de se basearem no essencial, servem apenas para dissimulá-lo, voluntariamente ou não, envolvendo-o com as aparências enganosas de uma “ficção” qualquer. Às vezes, essas aparências dissimulam-no de forma excessiva e se tornam tão invasoras que fazem com que fique impossível descobrir-se o sentido profundo e original. Não terá sido assim que, entre os gregos, o simbolismo degenerou em “mitologia”? Esse perigo é de se temer, especialmente quando o próprio poeta não tem consciência do valor real dos símbolos, pois é evidente que esse caso pode ocorrer. A fábula do “asno que transporta relíquias” aplica-se aqui, como em muitas outras coisas, e o poeta, então, desempenhará em suma um papel análogo ao do povo profano que conserva e transmite, sem o saber, dados iniciáticos, tal como dizíamos antes. [Guénon]

Literatura