Henri le Saux
SHIVA: lit. o benevolente, o benéfico, o propício. É o nome dado por muitos hindus à Divindade suprema [Parama-Shiva] e que o Padre De Nobili gostaria de conservar no Cristianismo, se não fossem as confusões mitológicas do termo. Num plano inferior, o terceiro membro da Trimurti [Brahma, Vishnu, Shiva ou Rudra]. Foi em Shiva, o benevolente, que se transformou o terrível Rudra védico, cuja sobrevivência é atestada no aspecto de Shiva, destruidor dos mundos ou ainda em Shiva Bhairava, “aquele que apavora”. Shiva é também o asceta por excelência, o maha-yogin, representado em atitude de meditação, com o corpo coberto de cinzas. A devoção a Shiva deu lugar no sul da índia a uma bhakti que nada fica a dever à bhakti vishnuíta ou krisnáica [cf. hinos dos Nãyanãr, o Tevaram, o Tiruvasagam de Manikka-Vasagar, o Tirupadal de Tayumanavar, etc].
“Quem diz que Shiva e o Amor [Anbu] são dois,
esse jamais soube nada;
Quem soube que o Amor e Shiva são o mesmo,
ele próprio tornado Shiva o amor,
reside já na suprema paz.”
Essa devoção shivaíta do país tâmul encontrou sua expressão filosófica no sistema do Shaiva-siddhanta [de Meykanda-devar, XIII. séc]. Paralelamente desenvolveu-se no Kashmir um outro sistema teológico, este propriamente advaíta, o pratyabhijna, cujo representante mais ilustre foi Abhinavagupta [século XI] — cf. também linga, nataraja.
André Padoux
Xiva é seu próprio si [svātma] sendo supremo sujeito conhecedor, pura consciência [cit]. Está, ao mesmo tempo, presente no conhecimento e na ação pois pode ser considerado como tendo três energias fundamentais: de pura consciência [cit-śakti], de conhecimento [jñāna-śakti] e de atividade [kriyā-śakti]. É por meio dessas duas últimas energias que se manifesta no universo: « o princípio de vida, escreve Abhinavagupta no P.T.v. [p. 27], se acha nas energias de conhecimento e de atividade », e Utpaladeva: « As energias de conhecimento e de atividade são consideradas como sendo o que anima os seres vivos » [I.P.K., 1, 4, p. 2].
É porque Xiva é encarado aqui como manifestando o universo que é descrito como abhimukha, quer dizer « voltado em direção ao mundo », termo que traduzi por « presente ». [tr. Antonio Carneiro]