Eros é, portanto, a norma básica para todos os valores — dos valores da vida aos valores ideais mais elevados; não se pode restringi-lo, então, ao “amor à vida” (Vitalliebe) ou ao amor sexual ou ao amor “intelectual”; pois, em todos os casos, estaria excluído o conceito básico de participação do núcleo (des Kerns) de uma pessoa finita no Ser essencial. (J. Sauter, Baader)
Assim como todos os seres… estão em relação inalterável com Deus, e essas relações são constitutivas — isto é, uma base de ser para eles — o mesmo vale para seus relacionamentos uns com os outros. Pois essas relações secundárias são meras consequências dessa relação primária e são mediadas por ela, assim como a relação dos pontos-periferia uns com os outros (é mediada) pela relação destes com seu centro comum. O amor fraterno e o amor ao próximo, portanto… como diz a Sagrada Escritura, fundamenta-se no amor a Deus, assim como o ódio ao próximo se fundamenta no ódio a Deus. Pois só tenho poder para ME unir verdadeiramente a outra pessoa se primeiro ME unir imediatamente a Deus e, da mesma maneira, só posso romper completamente com meu próximo se ME afastar ou ME afastar de Deus. (5.230)
Não é que você conheça, ame e precise de coisas diferentes dentro e fora de Deus — isto é, na eternidade e no tempo — mas sim que você conhece, ama e precisa das mesmas coisas de uma maneira diferente. Se você deixa criaturas onde estão divididas, fragmentadas, incompletas e em tensão, você as pega e as encontra novamente onde estão unidas e perfeitas (em Deus). É, portanto, uma ideia falsa e enganosa, sustentada por vários ascetas, dizer que amar a Deus, o Criador, contradiz o amor às criaturas, como se devêssemos ver Deus simplesmente como um objeto ao lado de criaturas como outros objetos, etc. Mas a religião nos ordena expressamente a amar as criaturas no Criador, não à parte dele ou mesmo contra ele. (5.263; veja também 2.180, 181)
Admite-se geralmente que o amor não busca os seus e que não se ama uma pessoa em quem não se confia mais do que se pode vê-la. Mas houve e há escritores que fazem uma exceção a isso no caso do amor de Deus e da fé nele, sustentando seriamente que se deve ser obrigado a confiar e acreditar em Deus apenas na medida em que se pode vê-lo ou observá-lo em sua atividade. Kant, por exemplo, não raciocina muito melhor sobre o amor do que um cego sobre a cor quando (seguindo a definição de Spinoza: Ideo bonum quia appetimus) define o amor como a inclinação que temos para o que nos traz vantagem…. O amor é amor apenas porque não é limitado pela necessidade, desejo ou natureza. (Não é, portanto, antinatural, no entanto). Pode-se ver isso na consagração do desejo sexual (que é por si só o zênite do egoísmo apaixonado, portanto, completo desamor) através do amor no casamento. (2.178-79)
A nota de Baader sobre este texto diz: “O ideal na cópula animal (o chamado amor) é desdobrar a raça eterna no declínio do indivíduo; mas o ideal do amor humano é desdobrar a raça eterna na unicidade da pessoa, de modo que é precisamente esta pessoa que é posta de acordo com sua unicidade eterna (como membro do todo). Este elemento único, portanto, representa tudo aos olhos de seu amante. Aqui temos um caso do Todo (Deus) brilhando na singularidade transfigurada da pessoa” (2.179 ss. 3).
O mesmo filósofo alemão de quem falamos (Kant) deduziu até o amor de uma convicção de vantagem líquida que a pessoa amada nos proporciona ou nos leva a esperar que o faça. Assim como ele estava infectado com a peculiar idiossincrasia de ser incapaz de tolerar qualquer oração pública (social), ele declarou ex cathedra que a oração é puro fetichismo. Seu Deus (a lei surda e muda) não era menos impessoal e desumano que o Deus de Spinoza. Devemos a ele agradecer particularmente o purismo da nova moral, que afastou toda relação pessoal do homem com Deus e, consequentemente, todo sentimento dessa moral. (5.282)
Baader acreditava estar alcançando uma profunda reviravolta no idealismo alemão — semelhante a Agostinho no início do idealismo medieval — e, de fato, por esta razão: que a forma fundamental de nossa participação no mundo-fundo último é regida pelo conteúdo essencial deste último. Se for, por exemplo, um Dever Categórico — como no caso de Kant e Fichte — então nossa participação máxima no ser último só pode, na natureza do caso, ser compartilhar desse Dever (Mit-sollen). Se for Pensamento primordial – então compartilhar isso (Mit-denken). Mas se é amor primordial – então compartilhar no amor (Mit-lieben). E esse amor é então – mesmo que não se permita uma primazia do amor – ontológica e noeticamente um poder que independe do ato racional de conhecer. Aquele que é tocado por Eros não tem dúvida de que está mais próximo do mistério do mundo quando está nesse estado do que em qualquer outro estado de exaltação. (J. Sauter)
Quanto mais intenso o sentimento de união entre ação e reação (quanto mais para dentro é a união), mais para dentro é o vínculo que liga o produto ao produtor. Quanto mais unidos estão os fatores de produção, mais intenso é seu sentimento (afeto) e mais próxima é sua união com o produto. Também no amor de Deus pelo homem há união mais íntima com a mais alta distinção. Mas a distinção, neste caso, tem a ver com a essência, enquanto a união tem a ver com a ação. (12.186)