Shakti: O Divino Feminino
“Shakti” significa poder, energia ou dinamismo. Sem Shakti, não pode haver criação. Como a energia que mantém o cosmos unido, ela é o movimento das galáxias que cria novas estrelas e buracos negros. Como o fogo digestivo, ela transforma o alimento em nutrientes e força. No estado de vigília, ela aparece como cada pensamento, emoção e ação. No estado de sonho, ela é o jogo da mente inconsciente enquanto ela vive e age de acordo com seus medos e fantasias. Como o estado de sono profundo, ela é a absorção da consciência em repouso. Como força evolutiva do planeta, ela é o movimento das placas tectônicas que cria continentes e oceanos. Como a grande mudança, ela é o terremoto, o tsunami e o vulcão.
Não há nada na criação que não seja uma manifestação de Shakti, o divino feminino. Em uma tradição tântrica específica, Shakti é venerada como as forças da criação em dez formas específicas conhecidas como Mahavidyas.
As dez grandes forças cósmicas de Shakti, as Mahavidyas
Na filosofia tântrica, a força masculina é chamada de Shiva e Shakti é sua energia dinâmica. No início, há apenas um potencial indiferenciado e atemporal, ou Shiva e Shakti juntos. O primeiro movimento na criação é o do reconhecimento de si — Shiva se volta para olhar para si mesmo e é Shakti, seu Eu Sou. Shakti é o poder de Shiva de experimentar a si mesmo. Diz-se que a criação começa nesse instante de aparente separação entre Shakti e Shiva. Aparente porque são inseparáveis, assim como o fogo nunca pode ser separado de seu calor.
Shiva é a com-ciência (awareness) imutável, enquanto Shakti é sua força dinâmica que dá vida à criação. Enquanto ele fornece o pano de fundo para a criação, ela executa todas as suas funções como Dasha Mahavidya, que se traduz como as “dez deusas da sabedoria”. Elas são Kali, Tara, Tripura Sundari, Bhuvaneshwari, Tripura Bhairavi, Chinnamasta, Dhumavati, Baglamukhi, Matangi e Kamalatmika. Como você verá neste livro, as Mahavidyas não são meras consortes de divindades masculinas — aqui, Shakti ocupa o centro do palco para gerar tempo, espaço, evolução e destruição.
A Sombra e a Luz
Os Mahavidyas compõem não apenas as forças criativas em escala cósmica, mas também as forças dentro de nós que levam ao sofrimento ou à liberdade. Assim como Shakti cria o cosmos, ela também dá origem à nossa identidade. E assim como o cosmos limita a ilimitada e divina Shiva-Shakti, nossa identidade limita nossa verdadeira natureza ilimitada. Essa limitação é a causa principal de nossa sensação generalizada de falta.
Cada Mahavidya representa um aspecto de nossa identidade limitada que mantém nossa sensação de falta e nos mantém no caminho da busca sem fim. Como a luz correspondente, nos desperta para nossa verdadeira natureza ilimitada.
Nosso modo natural de operação como seres limitados é perseguir o prazer e afastar a dor. Na sadhana dos Mahavidyas, aprendemos que essa dicotomia nos mantém presos ao sofrimento porque nunca poderemos ter a garantia de prazer o tempo todo. Aprendemos que nosso sofrimento não surge do fato de não conseguirmos o que queremos ou de conseguirmos o que não queremos. Mergulhamos na própria fonte do sofrimento e descobrimos que surge de nosso modo de operação que, por sua vez, é gerado por quem nos consideramos. Em vez de afastar nossa dor e nossas limitações percebidas, aprendemos a acolhê-las em nosso abraço amoroso.
Com esse passo corajoso, as próprias limitações que nos prendem se tornam veículos para a transformação e o despertar. Esse é um dos muitos paradoxos ao longo desse caminho em que fazer o que tememos ou abominamos nos dá os resultados que desejamos. Quando permitimos que nossos maiores medos surjam e simplesmente existam, eles se desfazem e se desintegram em amor-próprio sem reservas. Esse é um processo alquímico em que nos tornamos amor, irradiando e incluindo tudo em nosso ser. Esse é o fim da busca.