Corbin (1977) – espelho do Ser Divino

(Corbin1977)

Pode-se evocar novamente, a esse respeito, o problema dos Ash’aritas, que se questionam sobre se os atos do homem são criados pelo homem ou se o único agente é Deus. Também se fez, nesse mesmo contexto, uma aproximação com o que, em termos de filosofia moderna, se chama de ocasionalismo. Na verdade, há apenas uma única Criação, mas perpetuamente recorrente de instante em instante. E como Criação significa essencialmente teofania, a relação da criatividade do coração com a Criação perpetuamente recorrente pode ser definida ainda pela ideia de que o coração do gnóstico é o “olho” pelo qual o Ser Divino vê a si mesmo, ou seja, se revela a si mesmo. As relações de exterioridade e interioridade não se colocam aqui como se colocariam em qualquer outro sistema não fundamentado na ideia de epifania e na crítica docetista do conhecimento que está implicada nela. É por isso que, quando Ibn Arabi explica os fenômenos da criatividade do coração por meio das Hadarât, não há motivo para acusá-lo, como se ele estivesse cometendo uma confusão entre o subjetivo e o objetivo. Cada “Imaginação criadora” do gnóstico, seja produzida diretamente por ele a partir de uma Hadra superior ao plano de ser dessa Imaginação, ou seja produzida por ocasião de sua himmah e por intermédio dela, é [177] uma criação nova, recorrente (khalq jadîd), ou seja, uma nova teofania da qual seu coração é o órgão, como espelho do Ser Divino.

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