É difícil determinar a relação entre esses estudos e a “explosão ocultista” dos anos setenta. Talvez apenas os chamados centros de magia branca, agora florescentes na Inglaterra, refletiam a influência da teoria de Murray. Parece não haver nenhuma relação entre a pesquisa científica sobre a história da Astrologia – deixe-se bem claro, de bem modestas proporções – e a popularidade surpreendente dessa disciplina antiquíssima. Mesmo se tivéssemos mais tempo à nossa disposição, não poderíamos apresentar um quadro completo do prestígio contemporâneo da Astrologia nos Estados Unidos e na Europa. Basta dizer que pelo menos 5 milhões de americanos organizam suas vidas de acordo com predições astrológicas, e uns 1.200 dos 1.750 jornais diários do país publicam horóscopos.
Há atividade bastante para 10.000 astrólogos, trabalhando em tempo integral, e para outros 175.000, em meio horário. Calcula-se que mais ou menos 40 milhões de americanos fizeram do zodíaco um negócio que movimenta 200 milhões de dólares por ano. Atualmente, há vários computadores trabalhando no cálculo e na interpretação de horóscopos. Um desse publica um horóscopo de dez mil palavras em poucos minutos ao preço de 20 dólares. Um outro fornece horóscopos do dia a mais ou menos dois mil “campi” em todo o país. Um terceiro computador, localizado na Grand Central Station, imprime uma média de 500 horóscopos por dia.
Sabe-se, é claro, que a Astrologia, a esperança de se conhecer o futuro, tem sido sempre popular entre ricos e poderosos – entre reis, príncipes, papas, etc. – desde a Renascença. Pode-se acrescentar que, em última análise, a crença na previsão do destino pela posição dos astros é um outro exemplo da derrota do Cristianismo. Com efeito, os padres da Igreja atacaram ferozmente o fatalismo astrológico dominante nos últimos séculos do Império Romano. Taciano escreveu: “Estamos acima do Destino, o Sol e a Lua são feito para nós!” Apesar dessa teologia da liberdade humana, a Astrologia nunca foi extirpada do mundo cristão. Contudo, jamais, no passado, ela alcançou a proporção e o prestígio dos dias atuais. Que progresso fantástico desde o primeiro periódico mensal, editado em Londres, em agosto de 1971, até os muitos milhares de revistas astrológicas publicadas atualmente em todo o mundo ocidental. A história do sucesso vertiginoso e do prestígio da Astrologia nas sociedades modernas constitui leitura fascinante. A glória de Evangeline Adams, que chegou a Nova Iorque em 1899 e logo se tornou “A Nostradamus da América”, é apenas um exemplo modesto disso. Mary Pickford e Enrico Caruso levavam para ela todos os astros do cinema e da ópera, e comentava-se que o financista J. Pierpont Morgan “nunca realizava uma transação em Wall Street”, sem antes a consultar. Outros astrólogos tomaram -se famosos nos anos trinta, por exemplo, Thomas Menes, de quem se dizia ter “um recorde jamais ultrapassado de predições realizadas”. Apesar de a maior parte de suas predições ter-se revelado falha, seu prestígio não foi abalado por isso. Creio ser desnecessário lembrar-lhes o interesse de Hitler pela Astrologia. Conforme se pode ler na obra de H. R. Trevor-Roper, The Last Days of Hitler, em meados de abril de 1945, Hitler e Goebbels ainda consultaram o horóscopo, que lhes predizia uma vitória decisiva por ocasião do fim do mês e a paz em agosto. Contudo, Hitler se matou a 30 de abril e o exército alemão se rendeu a 7 de maio. Finalmente, podemos nos lembrar dos inumeráveis programas astrológicos que têm aparecido na televisão, apesar da interdição aprovada pela National Association of Broadcasters, em março de 1952, e do fato de “bestsellers” como o livro de Ruth Montgomery, A Gift of Prophesy, terem vendido mais que 260 mil cópias, em capa dura, e 2.800.000, em brochura.
Qual será a explicação desse sucesso fantástico? Recentemente, alguns sociólogos e psicólogos franceses publicaram um livro, Le Retour des Astrologues (1971), no qual apresentam e analisam os resultados de uma pesquisa baseada em dados fornecidos pelo French Institute of Public Opinion. Eu não entrarei em detalhes quanto às características sociais dos adeptos da Astrologia, classificados por sexo, ocupação, idade e tamanho das localidades onde esses dados foram obtidos. Citarei apenas algumas das conclusões: Edgard Morin, por exemplo, interpreta a atração exercida pela Astrologia sobre os jovens contemporâneos como “originária da crise cultural da sociedade burguesa”. Ele pensa que, para a cultura jovem, “a Astrologia faz parte também de uma nova gnose, que se fundamenta numa concepção revolucionária de uma nova era, a Era de Aquarius”. O que é altamente relevante é o fato de o maior interesse por Astrologia “não ser encontrado no campo, entre os fazendeiros e as camadas mais baixas da estrutura ocupacional, mas, ao contrário, nos centros urbanos, mais densamente povoados e entre os empregados de escritórios”.
Os autores franceses não insistiram na função para-religiosa da Astrologia, contudo, a descoberta da relação entre a vida e fenômenos astrais confere realmente um novo significado à existência. O homem não é o simples indivíduo anônimo descrito por Heidegger e Sartre, um estranho lançado num mundo absurdo e sem sentido, condenado à liberdade, conforme Sartre costumava dizer, um ser cuja liberdade restringia-se à sua situação e condição no seu momento histórico. É verdade que de acordo com a Astrologia, o movimento das estrelas determina a vida humana, mas essa determinante, pelo menos, tem uma magnitude incomparável. Não obstante ser, em última análise, um boneco guiado por cordas invisíveis, o homem considera-se, contudo, parte do mundo celestial. Além disso, essa pré-determinação cósmica de sua existência constitui um mistério: isso quer dizer que o universo se move de acordo com um plano preestabelecido; que a vida humana e a própria história seguem um modelo e avançam progressivamente rumo a uma meta. Esse objetivo último é secreto ou inacessível à mente humana; mas, pelo menos, dá sentido a um cosmos considerado pela maior parte dos cientistas como resultante do mero acaso, e dá orientação à existência humana, considerada de trop por Sartre. Essa dimensão para-religiosa da Astrologia é colocada em nível superior às demais religiões existentes, uma vez que não implica em quaisquer problemas teológicos de difícil solução: a existência de um deus pessoal ou transpessoal, o enigma da Criação, a origem do mal e outros. Basta seguir as instruções de seu horóscopo e o homem estará em harmonia com o universo e não terá que se preocupar com problemas difíceis, trágicos ou insolúveis. Simultaneamente, o homem aceita, consciente ou inconscientemente, que se lhe revele um drama cósmico, grandioso, embora incompreensível, do qual ele faz parte; por isso, ele não se considera de trop. [Eliade]