Evola Árvore

Julius Evola — A Tradição Hermética
Excertos da tradução de Maria Teresa Simões

Um dos símbolos que encontramos nas tradições mais diversas e mais afastadas no tempo e no espaço é o da Árvore. Metafisicamente, a Árvore expressa a força universal que se desenvolve na manifestação, do mesmo modo que a energia da planta se desenvolve desde as raízes invisíveis ao tronco, aos ramos, às folhas e ao fruto.

Associam-se, além de mais, à «Árvore», com um alto grau de uniformidade, ideias de imortalidade e de conhecimento sobrenatural, por uma parte, e, por outra, figurações de forças mortais e destrutivas, naturezas temíveis, como dragões, serpentes e demônios. Existe também todo um ciclo de mitos referentes a acontecimentos dramáticos que têm como centro a Árvore, e que por detrás dessa alegoria ocultam significados profundos. É popularmente conhecido, entre outros, o mito bíblico que relata a queda de Adão. Assinalaremos o conjunto mais vasto ao qual pertence este mito e determinaremos as suas variantes, não sem antes fazer referência à universalidade dos elementos simbólicos que o compõem.

Já nos Vedas e nos Upanixades encontramos a «Árvore do Mundo», às vezes invertida, para significar que «no alto», nos «céus», reside a origem da sua força. Já neles encontramos a convergência de vários dos elementos a que antes nos referimos, pois que ela segrega a bebida da imortalidade (soma ou amrta); pois quem se aproxima dela recebe a inspiração e uma visão que, superando o tempo, é como uma recordação de infinitas formas de existência; pois que no interior da sua folhagem se esconde Yama, o deus do além-túmulo, concebido também, não obstante, como um rei do estado primordial. No Irão voltamos a encontrar a tradição de uma árvore dupla, uma das quais contém, segundo o Bundahesh, todas as sementes, enquanto a outra é capaz de proporcionar a bebida da imortalidade (haoma) e a ciência espiritual; o que nos leva a pensar imediatamente nas duas árvores bíblicas do Paraíso, uma da Vida e outra, precisamente, da Ciência. A primeira converte-se depois em Mateus (XIII, 31-32) na figura do reino dos céus, que surge da semente lançada pelo homem no seu simbólico «campo»; encontramo-la mais tarde no Apocalipse de João (XXII, 2) e sobretudo na Cabala, como «a grande e potente Árvore da Vida», donde nos «chega a Vida desde o alto» e com a qual se relaciona uma «orvalhada» em virtude da qual se produz a ressurreição dos «mortos»: equivalência evidente com a força da imortalidade do amrta védico e do haoma iraniano.

A mitologia assírio-babilônica tem também uma «Árvore Cósmica» radicada em Eridu, a «Casa da Profundidade», chamada também «Casa da Sabedoria». Mas, acima de tudo, o que nos importa acentuar nestas tradições — porque nos vamos socorrer deste elemento seguidamente — é outra associação de símbolos: a Árvore apresenta-se-nos também como a personificação de uma «Mulher divina» do tipo geral das grandes deusas asiáticas da Natureza, como Ishtar, Anat, Tammuz, Cibele, etc. Encontramos, pois, a ideia da natureza feminina da força universal representada na Árvore. Esta ideia não se confirma apenas na deusa a que se achava consagrado o carvalho de Donona, que sendo, além disso, um lugar de oráculo, é também uma fonte de ciência espiritual: eram também as Hespérides as encarregadas de custodiar a árvore, cujo fruto tem o mesmo valor simbólico que o «Velo de Ouro» e a mesma força imortalizante que aquela outra árvore que na lenda irlandesa de Mag Meli está igualmente custodiada por uma entidade feminina; nos Edas1 é a deusa Idhunn a encarregada de guardar as maçãs da imortalidade, enquanto na árvore cósmica Yggdrassil tornamos a encontrar o símbolo central, já que se levanta ante a fonte de Mimir (guardando-a, o que confirma e reintroduz o símbolo do dragão nas raízes da Árvore), a qual, por outro lado, contém o princípio de toda a sabedoria.

Finalmente, segundo uma lenda eslava, na ilha de Bujan há um carvalho guardado por um dragão (que deve ser associado à serpente bíblica, aos monstros da aventura de Jasão, e ao jardim das Hespérides), que é simultaneamente residência de um princípio feminino, chamado a «Virgem da Aurora».

É pois muito interessante a variante, segundo a qual a Árvore se nos apresenta como a árvore do poder e do Império Universal, tal como a encontramos em lendas como as de Ogiero e do Prestes João, de quem já falamos noutra obra. Nestas lendas a Árvore desdobra-se às vezes numa Árvore do Sol e numa Árvore da Lua.

O hermetismo recupera integralmente a tradição simbólica primordial e apresenta a mesma associação de ideias. O símbolo da Árvore nos textos alquímicos é muito frequente: a árvore circunda a «fonte» de Bernardo Trevisano, no centro da qual se encontra o símbolo do dragão Uroboro, que representa o «Todo»; personifica o «Mercúrio», princípio primeiro da Obra hermética, mas representa a «Água Divina», ou «da Vida», que dá a ressurreição aos «mortos» e ilumina os filhos de Hermes, ou então a «Senhora dos Filósofos»; além disso também representa o Dragão, ou seja, a força dissolvente, um poder que mata. Também a Árvore do Sol e a Árvore da Lua são símbolos herméticos que produzem às vezes, em lugar de frutos, coroas.

Esta rápida passagem através de um material simbólico que poderíamos multiplicar indefinidamente basta para comprovar a permanência e universalidade da tradição de um simbolismo vegetal, que expressa a força universal, preferentemente concebida sob a forma feminina, com a qual se relaciona o sedimento de uma ciência sobrenatural, uma força capaz de dar a imortalidade e uma capacidade de domínio, mas ao mesmo tempo a ideia de um perigo, cuja natureza é diferente e que complica o mito em ordem a diversas vontades, a várias verdades e a diferentes visões.

Geralmente, o perigo é o mesmo que corre quem se lança à conquista da imortalidade e da sabedoria mediante um contacto com a força universal, e cuja força envolvente tem de suportar. Mas além disso conhecemos formas do mito nas quais são Heróis os que enfrentam a Árvore, e naturezas divinas (na Bíblia, o próprio Deus hipostasiado) quem a defende e lhe impede o acesso. O resultado é então uma luta interpretada de diversos modos, segundo as tradições.

A possibilidade é dupla: por um lado, a Árvore concebe-se como uma tentação, que leva à ruína e à maldição quem lhe sucumbir, por outro lado, concebe-se também como o objetivo de uma conquista possível, que, depois de vencer os dragões ou os seres divinos que a defendem, transforma o audaz num deus, e às vezes transfere o atributo da divindade e da imortalidade de uma estirpe para outra estirpe.




  1. Conjunto de duas coleções onde se reúnem as mais antigas tradições mitológicas escandinavas. 

Julius Evola