Ahamkara, no sentido filosófico, é então a estrutura fundamental que dá a chave do egoísmo universal. Como cada um se faz de centro último de referência e que não pode ter tantos absolutos quanto indivíduos, é provável que todos sejam vítimas da mesma ilusão, forjem o mesmo tipo de ídolo. O valor de “forjar” contido em -kāra (raiz KŖ) vem à tona aqui: o eu não existiria na própria realidade, mas seria um produto artificial -krtaka- e, como tal, -kŗtrima factício – a atividade mental dos sujeitos. Ao mesmo tempo, deve, de uma maneira ou de outra, preexistir essa mesma produção, pois, caso contrário, a distinção mútua dos forjadores não se baseará em nada. O ahamkara é, portanto, para cada sujeito, ao mesmo tempo, uma certa maneira ilegítima de se afirmar em sua singularidade em desprezo e em detrimento de outros, de se colocar incessantemente no centro do mundo, e uma estrutura já presente como o próprio fundamento de sua identidade pessoal. Embora tenhamos escolhido aqui torná-lo convencional pelo termo neutro e universal de “ego”, o ahamkara designa em seu próprio egocentrismo psicológico e metafísico, tanto a reivindicação subjetiva da singularidade quanto o fato primário do ‘um mundo organizado (ainda que espacialmente)’ ao meu redor. Mas essa ambiguidade também se manifestará na ordem axiológica. O fenômeno do ego não apenas nos leva a desviar-se para os becos sem saída do desejo que sempre recomeça e a luta de todos contra todos. Ao mesmo tempo, ele assinala em direção ao Si Mesmo, o Atman, como em direção ao valor supremo e arruína antecipadamente qualquer reivindicação a um “altruísmo desinteressado”, qualquer alienação do sujeito a serviço de entidades abstratas (os deuses, por exemplo) que não seriam “ele próprio”. O ahamkara é ao mesmo tempo revelação absoluta e seu desvio imediato na idolatria do corpo e de suas afiliações. Representa a forma mais sutil e, portanto, a mais temível, de ignorância metafísica e, ao mesmo tempo, serve como um fio comum para a auto-realização. Todas as soteriologias indianas meditam nessa realidade híbrida e paradoxal, procurando analisá-la, para isolar o ouro puro da absoluta ipseidade da base do chumbo do egoísmo.
Hulin (PEPIC:4) – ahamkara em sentido filosófico
TERMOS CHAVES: ahamkara
- Hulin (DSDT:117-121) – a vida é um sonho
- Hulin (DSDT:125-130) – a significação de “fora de”
- Hulin (DSDT:15) – A doutrina secreta da deusa Tripura
- Hulin (DSDT:17-18) – princípio de consciência
- Hulin (DSDT:175-177) – o conhecimento liberador
- Hulin (DSDT:59-66) – a condição permanente do Si-mesmo
- Hulin (DSDT:78-80): o Senhor
- Hulin (DSDT:83) – a chave de uma alegoria
- Hulin (PEPIC:132) – o mundo