Aquilo que impede alguns de demandar, é saber que Deus decidiu seu destino por toda eternidade; eles prepararam suas moradas [quer dizer suas almas] para acolher aquilo que descerá Dele, e eles dispuseram-se de seus egos e de suas existências individuais. Entre esses, há aquele que sabe que a Ciência que Deus tem dele, em cada um de seus estados, se identifica àquilo que ele é ele-mesmo em seus estados de imutabilidade [primordial] antes de sua manifestação; e sabe que Deus não lhe dará qualquer coisa que não resulte desta essência (al-ayn), que ele é ele-mesmo em seus estados de permanência primordial. Ele sabe portanto de onde resulta o Conhecimento divino a seu respeito. Nenhuma categoria de conhecedores de Deus não é superior àquela dos homens que assim realizam o mistério da predisposição. Eles se dividem por sua vez em dois grupos: aqueles que conhecem isto de uma maneira global, outros de uma maneira distinta; os segundos ocupam uma colocação superior; pois aquele que tem um conhecimento distinto daquilo do qual se trata reconhece isto que o Conhecimento divino implica a seu respeito, seja que Ele lhe desvela diretamente sua essência imutável (al-ayn ath-thabitah) e o desenrolar sem fim dos estados que dela derivam. É este último conhecedor que ocupa a colocação superior, pois no conhecimento dele-mesmo adota o ponto de vista divino, o objeto de seu conhecimento sendo o mesmo [que o objeto do Conhecimento divino]. No entanto, quando considera-se esta identificação [do conhecimento do contemplativo ao Conhecimento divino] do lado individual, ela apresenta-se como um ajuda divina predestinada a este indivíduo em virtude de um certo conteúdo de sua essência imutável, conteúdo que este ser reconhecerá do momento que Deus lhe fará ver; pois, quando Deus lhe mostra os conteúdos de sua essência imutável, que, ela, recebe diretamente o Ser1, isto vai além evidentemente das faculdades da criatura como tal; pois ela é incapaz de apropriar o Conhecimento divino que aplica-se a estes arquetipos (al-ayn aththabitah) em seu estado de não-existência (udum), estes arquetipos sendo apenas puras relações essenciais (nisab dhatiyah) sem formas próprias. É sob esta relação [quer dizer, em razão da incomensurabilidade do Conhecimento divino e do conhecimento individual] que dizemos desta identificação [ao Conhecimento divino] que ela representa uma ajuda divina predestinada a tal indivíduo.
A essência imutável ou arquetipo não tem ser como tal, pois é apenas uma possibilidade não-manifestada contida na Essência divina. É de uma maneira toda simbólica que o arquetipo pode ser considerado como um receptáculo (qâbil) ou um “molde” “opondo-se” ao Ser divino. Ver também o início do capítulo sobre Adão. ↩