VIDE: CÉU
Pierre Gordon: IMAGEM DO MUNDO NA ANTIGUIDADE
É inevitável que desde o início a realidade se encontre falseada pela imagem que dela se deu. Desde que se deixa o universo fenomenal para penetrar no mundo dinâmico, nosso simbolismo verbal e nossas representações sensíveis perdem todo o valor, posto que se referem à matéria espacial e temporal. Todas as descrições que se fornece do outro mundo erram portanto profundamente pela base e fazem desvirtuar o real.
É aí que se torna impossível figurar o inferno e o paraíso cristãos. Nem um nem outro, são lugares. São estados do pensamento, com aspectos correlativos da matéria. Representar um danado com uma face, é lhe conferir, em uma certa medida, ser, ao passo que ele é segundo o cristianismo um Eu mergulhado no nada, um Eu que aspira sem fim a um pouco de existência, e que busca nesta intenção, a se passar ao fogo–luz, substância material e energética das coisas, mas que este repudia e queima, em lugar de admiti-lo a se expandir em seu seio. Eis aí o que torna também perigoso, segundo as concepções cristãs , estes Eu em sofrimento de ser. Fazer deles fantasmas, é tornar incompreensíveis ao mesmo tempo sua natureza e as modalidades sutis da ação corrosiva incessante que exercem sobre o tecido da maya. Notas similares, formuladas em sentido inverso, poderiam ser apresentadas a respeitos dos seres «residentes no céu» — o céu, assim como o inferno não é a princípio «o outro mundo». Não é exterior ao universo físico. Portamo-lo em nós e podemos entrar por toda parte em contato com ele, como também portamos em nós e podemos criar não importa onde o inferno.