Ibn Arabi reconhece no Homem Perfeito um tipo particular de poder mágico. Isso não é de se admirar, porque o Homem Perfeito, como um “conhecedor” (‘arif), é, por definição, um homem com um poder espiritual extraordinariamente desenvolvido. Sua mente naturalmente demonstra uma atividade extraordinária.
Esse poder extraordinário é conhecido como himmah, que significa uma energia espiritual concentrada. De acordo com Ibn Arabi, um “conhecedor” pode, se quiser, afetar qualquer objeto simplesmente concentrando toda a sua energia espiritual nele; ele pode até mesmo trazer à existência algo que não existe de fato. Em resumo, um “conhecedor” é capaz de subjugar qualquer coisa à sua vontade. Ele é dotado do poder de taskhir.
A palavra taskhir nos faz lembrar do Rei Salomão. É amplamente conhecido e aceito no Islã que Salomão possuía um poder sobrenatural pelo qual podia dominar a natureza e movê-la à vontade. Ele podia, por exemplo, fazer com que os ventos soprassem em qualquer direção que desejasse. Diz-se que ele era capaz de controlar à vontade seres invisíveis.
Entretanto, de acordo com Ibn Arabi, Salomão não exercia seu controle sobre a natureza por meio de seu himmah. Nesse aspecto, Salomão ocupa um lugar muito especial. Foi um favor especial de Deus concedido a ele de uma maneira peculiar. Pois, para realizar milagres, ele não precisava recorrer à concentração mental específica conhecida como himmah. Ele tinha apenas que “comandar” (amr). O que quer que fosse ordenado por ele para fazer qualquer coisa, se movia imediatamente como foi ordenado. Esse tipo de taskhir é, na opinião de Ibn Arabi, um grau mais elevado do que o taskhir por himmah, porque o primeiro é um trabalho direto sobre o objeto.
O taskhir que era peculiar a Salomão, que o tornava superior aos outros, e que Deus lhe havia dado como parte (essencial) da realeza que nunca seria dada a ninguém depois dele — esse taskhir era caracterizado por ser exercido por sua “ordem”. Deus diz: “Assim, subjugamos a ele (ou seja, Salomão) o vento, para que soprasse por seu comando” (XXI, 81) (O que é realmente característico do caso de Salomão) não é o simples fato de que ele podia exercer o taskhir. Pois Deus diz a respeito de todos nós, sem qualquer discriminação: “E subjugamos a ti tudo o que há no céu e na terra” (XXXI, 20). Assim, Ele fala de ter colocado sob nosso controle os ventos, as estrelas e outros. Mas (em nosso caso) o taskhir não ocorre por nossa ordem, mas pela ordem de Deus. Portanto, ao refletirmos, descobriremos que o que era peculiar a Salomão (não era o taskhir em si), mas, de fato, que (o taskhir) poderia ser exercido por seu próprio comando. Para fazer isso, ele não precisava de nenhuma concentração mental ou himmah; tudo o que ele tinha de fazer era “comandar”.
Menciono esse ponto especificamente porque todos nós sabemos que as coisas do mundo podem ser afetadas e influenciadas por um tipo específico de força mental quando esta se encontra em um estado elevado de concentração. Testemunhei esse fenômeno em minha própria vida (mística). Salomão, no entanto, tinha apenas que pronunciar a palavra de comando para qualquer coisa que quisesse controlar, sem que houvesse necessidade de himmah e concentração.