Jean Klein (JKJU) – meditação e resíduos

tradução

Qual é o papel da meditação na eliminação dos resíduos do passado?

A verdadeira meditação é a ausência de um meditador, absolutamente fora de uma relação sujeito-objeto. Somente ela, a lucidez atemporal, tem o poder de nos tirar das garras dos automatismos: pensamento, memória. Por meio de sua presença, ela libera e regula — sem querer regular nada — as energias que formam esses automatismos.

O pensamento não seletivo cria uma impressão dolorosa. Temos a sensação de regredir a um estado infantil.

Você localiza o “eu sou”, e essa objetivação dá um certo peso, um certo dinamismo que proporciona uma segurança aparente, uma sensação de segurança. O pensamento seletivo sempre tende a algo, a um resultado, a um objetivo. Na não-localização de si mesmo, você sente um vazio, como se um suporte tivesse sido retirado de você, como alguém que pulou várias refeições e não sente mais a sensação habitual de volume: ele lamenta uma ausência, ainda não se deu conta das delícias de um estômago vazio. Uma mente sem mobília não é mais uma mente, é o Si, a paz e a alegria, que é o que você é fundamentalmente, e só pode ser encontrado no desabrochar da lucidez silenciosa, absolutamente não dual.

Assim que um eu intervém, você está entre os demônios. A realidade é obstruída pela presença do mundo nos estados de vigília e sonho, e por sua ausência no sono profundo. A presença e a ausência devem ser resolvidas para que o pano de fundo se torne uma experiência vivida.

A atenção silenciosa é uma contemplação das coisas, sem reflexão, sem limitação por uma escuta restrita, sem um fim específico. Nessa observação não apreensiva, a dualidade sujeito-objeto desaparece, deixando apenas a lucidez. O acúmulo de ideias nos dá um senso de identidade; nunca nos sentimos sem percepção. Você, como pintor, entenderá facilmente um exemplo que lhe permite ver isso claramente: se você começar a esboçar seu desenho com elementos lineares, contornos, ele é inerte, é um corpo sem vida própria, como a memória. Por outro lado, se você começar com o elemento de massa e cor, suas massas crescerão, definindo lentamente seus limites e contornos, e seu desenho será vivo e criativo. Esse exemplo ilustra a diferença entre o pensamento discursivo e seletivo e o pensamento espontâneo, não elaborado por um ego.

Se o pensamento instantâneo é atemporal, ele surge no momento em que a mente está vazia de qualquer noção ou oposição. Qual é a posição dele em relação à iluminação?

A expressão pensamento atemporal pode dar origem a um mal-entendido, porque todo pensamento é um mecanismo de defesa que ocorre no tempo. Usamos essa palavra por falta de um termo melhor. Talvez a percepção interna fosse mais precisa. Essa percepção instantânea ocupa todas as direções do espaço com perfeita simultaneidade, como um relâmpago, e a pergunta que a precedeu, decantada pelo instrutor, perde seu esqueleto, sua substância; ela se torna integrada e nos dá um vislumbre claro da perspectiva da verdade. O pensamento condicionado deixa sua marca em nós; o pensamento espontâneo, não elaborado por um ego, prepara nosso terreno, harmoniza-o, e não o encontramos mais como era antes. Podemos dizer que a visão da perspectiva precede a iluminação.

original

Páginas em