Maya

Notions philosophiques, 1990

Vedismo

No Veda, maya é um “poder” maléfico específico das forças demoníacas. Os deuses guerreiros, sobretudo Varuna e Indra, triunfam sobre os demônios ao se apoderarem de sua maya ou ao empregarem uma maya de mesma natureza, mas mais eficaz. Esse “poder” é a arte de suscitar formas, de assumir formas diversas e mutáveis, de desconcertar o adversário aprisionando-o nesse jogo mágico de aparências. Maya é desorganizadora, pois permite que um mesmo ser seja visto sob múltiplas identidades. A multiplicidade que caracteriza os efeitos desse poder ilusório afeta, às vezes, a maneira como a própria causa é nomeada: não é raro que, no Veda, se mencionem as maya, no plural, de certos deuses ou demônios. Isso justifica sua etimologia pela raiz MAY-, que significa “mudar, trocar”.

No entanto, o Veda nos revela uma outra maya, positiva, que é a potência fundadora e até mesmo criadora dos deuses. Por meio de sua maya, os deuses “realizam certas estruturas eficientes” (L. Renou, L’Inde fondamentale, p. 138), que dão forma ao cosmos e estabelecem seus ritmos. Essa segunda maya frequentemente tem como ponto de partida um “ato de mensuração” (L. Renou, ibid.). Nesse sentido, maya seria um termo totalmente distinto do outro e se explicaria como um derivado da raiz MA, “medir”.

A maya demoníaca e a maya antidemônio, que os deuses opõem a ela, são forças desagregadoras que vão contra a ordem cósmica (rta; ver este termo) e se assemelham, em muitos aspectos, a outra potência destrutiva: nirrti (ver este termo). Ou melhor, essas forças se manifestam em um mundo que está abaixo do rta. Assim, um hino se dirige ao deus Agni nos seguintes termos: “Além da maya, no rta, é lá que sempre esteve teu nome” (RGVeda, V, 44, 2). Em contrapartida, a maya “mensuradora” é a força que permite aos deuses construir o rta: as regulações cósmicas são simultaneamente uma manifestação do rta e uma emanação da maya de Varuna (ver, por exemplo, RGVeda, IX, 73, 9).

Além disso, o Veda insiste, especialmente nos textos da segunda fase, que é a posse do sacrifício, a conquista do conhecimento sacrificial, que garante aos deuses a vitória sobre seus rivais demoníacos. Por isso, não surpreende ver a maya do sacrifício glorificada, pois ela é capaz de repelir os laços da morte (Kathaka-Samhita, XXXVIII, 13).

Desde os textos védicos, percebe-se que esses homônimos se fundem e que os dois sentidos se “interligam” (L. Renou, ibid., p. 140). Essa ambiguidade, geralmente intencional, explica o valor que o termo maya assumirá na especulação do Samkhya e do Vedanta. (C. Malamoud)


Vedanta

Nos darshana bramânicos—essencialmente o Vedanta e o Samkhya-Yoga—, a noção de maya não se distingue realmente da de avidya ou “nesciência”, podendo até ser considerada um simples sinônimo. No entanto, deve-se notar que o termo maya tende a substituir avidya sempre que se enfatiza:

  1. seu caráter coletivo, e não apenas individual, da nesciência;
  2. seu aspecto “objetivo”, ou seja, o efeito da dispersão do brahman na infinidade das formas (rupa) do universo sensível;
  3. sua dimensão “ilusionista” da manifestação.

A associação desses dois últimos aspectos pode parecer surpreendente. Contudo, ela se justifica dentro da teoria do vivarta (ver este termo), característica do Vedanta não dualista. A emanação das estruturas cósmicas a partir do brahman, que, em última instância, é irreal, constitui o modo peculiar pelo qual o brahman se oculta de nosso conhecimento direto—exatamente como a corda, na penumbra, se disfarça sob a forma ilusória de um pseudo-serpente. Assim, se justifica a existência de duas “potências” (sakti) do brahman: uma potência de “velamento” (avarana) e uma potência de “projeção de formas” (viksepa). (M. Hulin)


Mahayana

Magia; prestígio mágico; fantasmagoria.” No Mahayana, o significado inicial do termo é o de um prestígio mágico criado por um mago. Mas a imagem do prestígio mágico assume uma dignidade eminente: ela é a primeira de dez comparações que ajudam a compreender a verdadeira natureza das coisas. O mundo, composto de dharma vazios (sunya), é comparável a uma fantasmagoria (maya). No entanto, essa fantasmagoria não tem um criador: o mundo, comparável a um prestígio mágico, não tem começo (anadi).

A fantasmagoria aprisiona os seres que nela estão envolvidos, caso tomem sua aparência como real, incluindo a si mesmos. No entanto, ela perde seu poder à medida que os seres compreendem sua verdadeira natureza e se libertam dos hábitos adquiridos. Os Buddhas também, na medida em que permanecem presentes no mundo, possuem uma essência mágica e podem ser agentes de prestígios mágicos. Por terem compreendido a natureza do mundo, são capazes de organizá-lo para fins salvadores, por meio da magia que é o ensinamento da Lei. Assim, o mundo se transforma em um “campo de Buddha” (buddha-ksetra), um universo estruturado para a libertação dos seres que o habitam.

Os Bodhisattvas compartilham desses poderes dos Buddhas conforme seu grau de avanço espiritual e intelectual. Em última instância, embora infinitamente sério—pois envolve os tormentos do sofrimento (duhkha) e o árduo caminho para a liberação—, o drama cósmico da servidão e da libertação não possui consistência real. (J. May)