Tudo o que conheço na vida, tanto dentro de mim quanto no mundo exterior, está mudando de momento a momento. O que, portanto, pode ser realmente confiável?
Podemos ter certeza de duas coisas. A primeira é que existe consciência, “eu sou”, que nós existimos. Qualquer que seja essa consciência, ela é o que chamamos de “eu”. A segunda coisa de que podemos ter certeza é que algo existe. Quando temos alguma experiência, temos certeza de que existe algo em vez de nada. A esse “algo” chamamos de “realidade”. Podemos não ter certeza de qual é a natureza desse “algo”; no entanto, temos certeza de que existe “algo”. Podemos ter certeza absoluta apenas desses dois fatos.
Não temos certeza de qual é a verdadeira natureza desse “eu” ou desse “algo”, mas o problema não é a nossa incerteza. O problema são nossas pseudocertezas, nossas crenças sobre o que esse “eu” e esse “algo” realmente são. Por exemplo, acreditamos que “eu”, a consciência, está contida na mente e que essa mente está contida no corpo. Entretanto, se nos perguntarmos: “Como sei disso?”, descobriremos que, na verdade, não há nenhuma evidência experimental que corrobore essa afirmação. Trata-se simplesmente de uma crença que adotamos. No entanto, se adotarmos o que está sendo dito aqui como uma nova crença, isso tornará nosso caso ainda pior: não apenas abrigamos a crença original, mas agora outra foi acrescentada a ela. Portanto, temos que descobrir por nós mesmos se é verdade ou não que a consciência surge no corpo ou na mente.
Se afirmarmos que a consciência surge no corpo, deve haver algo presente para testemunhar seu surgimento. Da mesma forma, se afirmarmos que a consciência surge na mente, então, antes de seu surgimento, ou seja, na ausência de consciência, deve haver algo presente para vivenciar seu surgimento. Se houver algo presente para testemunhar o surgimento da consciência, então esse algo seria o que chamamos de “consciência”. Se não há nada presente para testemunhar o surgimento da consciência, então não podemos legitimamente afirmar que ela surge no corpo ou na mente. Portanto, de qualquer forma, quando dizemos ou pensamos que a consciência está no corpo ou na mente, trata-se de conhecimento falso. Se analisarmos mais de perto o que esse falso conhecimento faz por nós em nossas vidas, veremos que ele gera confusão e sofrimento.
Se considerarmos o outro lado da equação, que se relaciona aos objetos, às coisas, à nossa experiência e certeza de que existe algo em vez de nada, seja lá o que esse “algo” realmente for, temos de ver claramente que esses objetos, seja qual for sua realidade última, sempre aparecem na consciência. Portanto, nosso acesso à realidade deles, à verdadeira natureza do que quer que seja experimentado, é sempre feito por meio da consciência. Isso é muito importante e geralmente é ignorado. Presumimos que temos acesso direto às coisas em si mesmas e que essas coisas existem independentemente da consciência, mas não é assim. O que quer que experimentemos, sempre o fazemos por meio da consciência. No entanto, excluímos a consciência de nosso modelo de realidade, que é considerada independente dela.
Que evidência temos de que a realidade, a verdadeira natureza das coisas, é independente da consciência? Absolutamente nenhuma. Acreditamos que isso seja verdade sem evidências. Se nos perguntarmos se já experimentamos algo sem consciência, a resposta será inequivocamente: “Não!” No entanto, com a mesma convicção e em flagrante contradição com nossa experiência real, afirmamos que os objetos existem independentemente e separados da consciência. Essa convicção é a causa principal do conflito e da miséria.
Entretanto, não devemos adotar essa nova perspectiva, mas simplesmente nos libertar da crença de que a realidade é independente da consciência. Estamos, então, abertos a outra possibilidade na qual a realidade, a natureza última das coisas, surge da consciência e, portanto, é una com ela. Afinal de contas, essa é a nossa experiência real.
A abordagem para uma verdadeira compreensão dos objetos, que ignora a presença da consciência, é autolimitada, porque nosso conhecimento da realidade dos objetos só pode ser tão bom quanto nosso conhecimento da consciência. A abordagem científica da realidade ignora esse fato propositalmente. Ela limita sua investigação ao domínio dos fenômenos do mundo, esquecendo-se do fato de que eles são inseparáveis da consciência. Portanto, o conhecimento obtido por esses meios é inerentemente limitado, porque o escopo da investigação é limitado desde o início.
Se o único caminho para o conhecimento absoluto é por meio da consciência, como vamos proceder? Simplesmente vendo, olhando. A consciência, aquilo de que temos certeza absoluta, seja o que for, é também aquilo que chamamos de “eu”. No entanto, negligenciamos esse “eu”, esquecemos nosso Si, o excluímos da maneira como vemos e entendemos o mundo e sobrepusemos a ele crenças, conceitos e sentimentos que foram herdados de nosso ambiente, de nossas experiências e talvez até de nossos genes.
Tudo o que precisa ser feito para perceber a verdadeira natureza da realidade é liberar a consciência das crenças, conceitos e sentimentos acumulados que sobrepusemos a ela. Fazemos isso simplesmente por meio da visão, do acolhimento. Para que isso seja realizado, precisamos de uma certa qualidade de energia, de intensidade, que chamo de amor pela verdade.