(Panofsky2019)
Uma proporção considerável dos retratos de melancólicos mencionados anteriormente compartilha um motivo adicional com a Melencolia de Dürer que, para o observador moderno, parece tão óbvio que dispensaria um estudo de sua derivação histórica. No entanto, o próprio esboço preliminar de Dürer para a gravura — que diverge justamente nesse aspecto — revela que esse gesto não deriva simplesmente da observação da atitude melancólica, mas emerge de uma tradição pictórica milenar. Trata-se do motivo da face apoiada na mão.
Esse gesto ancestral, que já aparecia nos enlutados dos relevos de sarcófagos egípcios, tem como significado primário a dor, mas pode também expressar fadiga ou pensamento criativo. Limitando-nos aos tipos medievais, ele representa não apenas a dor de São João aos pés da Cruz e a tristeza da “anima tristis” do salmista, mas também:
- O sono pesado dos apóstolos no Monte das Oliveiras,
- O monge sonhador nas ilustrações do Pelerinage de la Vie Humaine,
- A concentração de um estadista,
- A contemplação profética de poetas, filósofos, evangelistas e Padres da Igreja,
- Ou até o repouso meditativo de Deus Pai no sétimo dia.
Não surpreende, portanto, que esse gesto tenha surgido naturalmente ao artista quando se tratava de representar uma configuração que combinava, de modo quase único, a tríade dor, fadiga e meditação — isto é, ao retratar Saturno e os melancólicos sob seu domínio. De fato, a cabeça velada do clássico Kronos repousa tão pensativamente sobre a mão quanto a do Hércules melancólico em algumas representações antigas.
Nas imagens medievais de Saturno e da melancolia — que já haviam perdido quase toda ligação direta com a tradição pictórica antiga —, esse motivo muitas vezes recuou para segundo plano, mas nunca foi totalmente esquecido. Um exemplo é a descrição de Saturno no Livro do Xadrez do Rei Afonso como “um velho triste, com a mão no rosto como homem preocupado”. Foi assim fácil que ele recuperasse seu significado típico nos séculos XV e XVI, embora sua renovação tenha surgido de impulsos muito diferentes no Norte e no Sul:
- No Norte, o crescente interesse pela representação realista de tipos psicológicos distintivos reviveu esse gesto da cabeça inclinada em retratos de melancólicos — embora, por algum tempo, tenha sido omitido nas imagens de Saturno.
- Na Itália quinhentista, onde retratos dos quatro temperamentos eram praticamente desconhecidos (o único exemplo conhecido é uma cópia modificada de um ciclo nortenho), foi o desejo de caracterizar indivíduos (e não tipos) e, sobretudo, de reviver o mundo ideal da mitologia clássica que levou à restituição desse gesto clássico de Saturno. O melancólico de cabeça apoiada na mão, comum em manuscritos e gravuras alemães, encontra paralelos italianos em:
- Heráclito na Escola de Atenas de Rafael,
- O Saturno da gravura B4 de Campagnola — majestosa encarnação da contemplação divina, que só posteriormente influenciou retratos da contemplação humana em geral.
Seja por influência dos retratos setentrionais da Melancolia ou de modelos italianos como a gravura de Campagnola, Dürer seguiu a tradição pictórica ao substituir — na versão final da gravura — as mãos pendentes e letárgicas da figura sentada no esboço preliminar (sintoma típico da melancolia patológica, segundo os médicos) pelo gesto pensativo da mão apoiada no rosto.