Nisargadatta (NMNI:3) – dualidade

O funcionamento do universo manifesto é chamado de jogo de prakriti e purusha — isto é, dos aspectos feminino e masculino.

tradução

Como e por que o estado de minha existência, minha existência e toda a manifestação surgiram e saíram de quê? Nesta fonte original, não há sentimento da minha presença. Para esta fonte última, como aconteceu o estado de existência que resulta em diferenciação [dualidade]?

Os Upanishads e vários sistemas de yoga são fantasias conceituais. Eu não entrei em tudo isto. Eu perguntei apenas sobre o meu “não-sendo” e sendo, e como e por que eles aconteceram.


V: A todo momento nascemos.

M: Sim, a cada momento nascimentos têm lugar. Mas o que é este material que nasce?

V: O que pode ser?

M: No “não-sendo”, o sendo apareceu; e no sendo, milhares de nascimentos e formas vivas são criados em um momento.

V: Mas o pano de fundo de tudo isto é apenas o “nada”.

M: Também deve haver um conhecedor deste “nada”, e esse conhecedor também é “nada”! No “não sendo”, como isto poderia ser expresso e quem o faria? Neste estado, não há sujeito nem objeto, e é chamado nirvishaya. Mas no estado de sendo, sujeito e objeto são aí, portanto, é chamado savishaya.

Você entendeu que a ioga de Pantanjali lida com a dualidade? Você estudou yoga? Trata-se de “jugo” [[O termo ‘yoga’ deriva do yuga sânscrito, que significa jugo ou união.]] ou não-jugo?

V: Eu li um pouco. O yoga lida com a dualidade.

M: De que Patanjali criou a dualidade? Quando ele estabeleceu a dualidade, o que ele dividiu? O que quer que ele tenha dividido, não estava no reino do sendo — na esfera do sujeito-objeto?

V: No momento em que se tenta dividir algo, ele se torna “objetivo”.

M: Mas o princípio último é anterior à esfera do sujeito-objeto. Eu gostaria de saber como você divide este estado.

No estado de “não-sendo”, o sendo apareceu junto com a manifestação, criando um sentimento como “eu sou”. Quem é este não é importante; somente “eu sou” é importante.

Nós conversamos sobre dualidade. Começou com a aparência do sendo sobre o “não sendo” ou se desenvolveu mais tarde? É simples. Quando o sendo — ou seja, o “eu sou” — é sentido, é óbvio que a Qualidade [[isto é, a conscientidade de atributos, qualidades, tornou-se possível na conscientidade.]] teve início. Mais tarde, o sendo manifesta-se como multiplicidade, funcionando como ocorre através de inúmeras formas. O zumbido inicial do sendo como “eu sou, eu sou” é a dualidade. Mas quem aceita a dualidade? O “não-sendo” aceita a dualidade com o sendo. O estado absoluto de “não-sendo”, assumindo o estado de sendo, torna-se dual na manifestação.

Palavras criam dualidade entre nós. Duas pessoas estão sentadas em silêncio e, portanto, não há brigas. Mas no momento em que eles começam a falar, a dualidade começa.

Quando o estado de “não sendo” expressa objetividade [[O mundo como “objetos”; isto é, o manifesto.]] através do estado de sendo, o último é chamado maya, o aspecto feminino, enquanto o estado de “não-sendo” é considerado o aspecto masculino. Portanto, o funcionamento do universo manifesto é chamado de jogo de prakriti e purusha — isto é, dos aspectos feminino e masculino.

original

How and why did the state of my beingness, my existence, and the entire manifestation arise and out of what? In that original source, there is no feeling of my presence. To that ultimate source, how did the state of existence resulting in differentiation [duality] happen?

The Upanishads and various systems of yoga are conceptual fantasies. I did not go into all these at all. I inquired only about my “non-beingness” and beingness, and how and why they did come about.


V: Every moment we are born.

M: Yes, every moment births take place. But what is that material which is born?

V: Whatever that maybe?

M: On the “non-beingness” beingness has appeared; and in [23] the beingness, thousands of births and live forms are created within a moment.

V: But the background of all this is “nothingness” only.

M: There should also be a knower of this “nothingness,” and this knower is “nothingness,” too! In the “non-beingness,” how could that be expressed and who would? In that state, there is no subject and no object, and it is called nirvishaya. But in the beingness state, both subject and object are there, hence it is called savishaya.

Have you understood that Pantanjali yoga deals with duality? Have you studied the yoga? Does it deal with yoking [[The term ‘yoga’ stems from the Sanskrit yuga, meaning yoke or union.]] or unyoking?

V: I have read a little. The yoga deals with duality.

M: Out of what did Patanjali create duality? When he established duality, what did he divide? Whatever he divided, was it not in the realm of beingness—in the sphere of subject-object?

V: The moment one tries to divide something, it becomes “objective.”

M: But the ultimate principle is prior to the sphere of subject-object. I would like to know how you divide that state.

On the state of “non-beingness,” the beingness appeared together with manifestation, creating a feeling as if “I am.” Who that is, is not important; only “I am” is important.

We talked about duality. Did it begin with the appearance of beingness over “non-beingness” or has it developed later? It is simple. When the beingness—that is, the “I-am-ness”— is felt, it is obvious that Quality [[That is, awareness of attributes, qualities, has become possible in the consciousness.]] has begun. Later, the beingness manifests as multiplicity, functioning as it does through [24] innumerable forms. The initial humming of the beingness as “I am, I am” is the duality. But who accepts the duality? The “non-beingness” accepts duality with the beingness. The Absolute “non-being” state, by assuming the being state, becomes dual in manifestation.

Words create duality between us. Two persons are sitting quietly and so there is no quarrel. But the moment they start talking, duality begins.

When the “non-being” state expresses objectivity [[The world as “objects”; that is, the manifest.]] through the being state, the latter is called maya, the female aspect, while the “non-being” state is considered the male aspect. Therefore, the functioning of the manifest universe is called the play of prakriti and purusha—that is, the female and male aspects.

Nisargadatta Maharaj (1897-1981)