Schuon (EPV) – Religio


Deixando de lado elementos secundários, as três religiões semíticas têm a mesma perspectiva geral do monismo de Ramanuja e não o do não-dualismo de Shankara, embora esse não-dualismo se manifeste de forma esporádica no interior dessas religiões, precisamente no seu esoterismo sapiencial. Um erro que convém evitar, em todo caso, é a ideia de que as grandes autoridades teológicas, até mesmo os padres da Igreja, são, em virtude de sua importância, promovedores do esoterismo total. Certamente, os Tomás de Aquino, os Ashari e os Maimônides encarnam a perspectiva religiosa geral com aberturas que incidem sobre a gnose, mas não se pode exigir que forneçam o equivalente integral do Vedanta advaitino e shankariano, apenas em virtude do papel de primeira grandeza que desempenham em sua respectiva religião. Aliás, é este papel ou esta importância que impede que a doutrina explícita e pública dos grandes teólogos supere o ponto de vista do monismo vishnuíta, embora — repetimos — neles encontremos elementos que de fato o ultrapassam. Mas nem esses doutores nem os seus partidários deduzem as consequências que esses elementos pressupõem.

Devemos insistir aqui sobre duas coisas. Primeira, que as próprias testemunhas da Revelação, apóstolos ou companheiros, não foram necessariamente jnanis, e que a própria forma da Mensagem, ou sua intenção direta, não admite que a maioria desses veneráveis tenha tido essa qualidade; uma minoria a possuía, necessariamente. Segunda, que um sábio perfeito é sempre um santo, mas que um santo nem sempre é sábio. Assim também, a noção polêmica de uma “sabedoria dos santos” dirigida contra o esoterismo sapiencial não passa de um mal-entendido e de um abuso de linguagem. Conhece-se esta petição de princípio da teologia militante: Platão, Plotino, Proclo e outros não foram cristãos, portanto, não podiam ser santos. Consequentemente, suas doutrinas dizem respeito à “sabedoria segundo a carne”, ao passo que era necessário inferir a elevação de suas doutrinas à sua possível santidade, do mesmo modo que o Cristianismo, enfim, não podia privar-se deles. Quanto à filosofia profana e propriamente racionalista dos gregos, personificada sobretudo por Protágoras, e da qual Aristóteles não é totalmente indene, ela representa um desvio da perspectiva que normalmente cede lugar à gnosis ou ao jnâna. Mas quando essa perspectiva está separada da Intelecção pura e, portanto, de sua razão de ser, torna-se fatalmente hostil à religião e permeável a todas as aventuras. Os sábios da Grécia não precisavam dos padres da Igreja para saber disso, e os padres da Igreja não puderam impedir que o mundo cristão caísse nessa armadilha. Contudo, pelo civilizacionismo, que ela torna seu a fim de não deixar escapar nenhuma glória, a Igreja assume paradoxalmente a responsabilidade do mundo moderno — qualificado de “civilização cristã” —, que, no entanto, nada mais é que a excrescência da sabedoria humana estigmatizada pelos padres.

Como falamos aqui de desvio intelectual, mencionaremos, nesta oportunidade, duas obscurações notórias da perspectiva esotérica, ou seja, a idolatria e o panteísmo, ambas oriundas da ideia de imanência em detrimento da transcendência e ambas comportando protótipos legítimos que, aliás, coexistem com os desvios, e deve-se tomar cuidado para que não sejam com eles confundidas. Todavia, há gêneros de idolatria que têm origem puramente mágica e empírica, assim como há gêneros de panteísmo que não têm outra origem senão as conjunturas dos filósofos.

Seja como for, existe na equação exotérica entre a inteligência e o orgulho um ensinamento pertinente: quem quiser usar a inteligência sem risco de enganar-se deve possuir a virtude da humildade; deve ter consciência de suas limitações, deve saber que a inteligência não vem dele próprio, deve ser bastante prudente para não julgar nada na inexistência de dados suficientes. Mas esta consciência, ou esta humildade, faz parte justamente da inteligência, na medida em que esta implica por definição a objetividade. Se a humildade — não o humilitarismo sentimental com aplicações absurdas — constitui uma qualificação sine qua non da gnose ou do jnâna, é porque a sapiência baseia-se na inteligência e esta, sendo objetiva na medida em que é integral, comporta, inevitavelmente, a consciência imparcial do que é, inclusive as nossas eventuais limitações. O perigo do orgulho surge com o racionalismo, isto é, com a decisão de se fiar numa inteligência simplesmente raciocinante, desprezando dados indispensáveis, cuja ausência nem se sente.

Dito isto, voltemos à questão do esoterismo na qualidade de fenômeno tradicional. Seria totalmente errado acreditar que a gnose, no interior de determinada religião, se apresenta como uma doutrina estranha e suplementar; muito pelo contrário, não é qualquer conceito secreto de caráter heterogêneo que fornece a chave para o esoterismo total ou não-dualista de cada religião e, sim, a própria ideia-força da religião. Assim, vê-se, necessariamente, que a religião, ao apresentar-se com uma exigência absoluta — “fora da igreja, nenhuma salvação” — é, por isso mesmo, responsável pela totalidade da mensagem e, consequentemente, não pode excluir nenhuma possibilidade essencial do espírito humano. A gnose cristã certamente tem alicerces em Tomás de Aquino, bem como em Gregório Palamas, mas esses alicerces estão de fato neutralizados pelo bhaktismo geral do Cristianismo, a não ser que sejam isolados precisamente desse contexto; em todo caso, não constituem o fundamento da sapiência. A gnose cristã apoia-se a priori, e necessariamente, nos mistérios da Encarnação e da Redenção, portanto, no fenômeno cristão em si, assim como a gnose muçulmana, por seu lado, se apoia antes de tudo nos mistérios da Transcendência e da Imanência, portanto, na Verdade coránica ou maometana. Além disso, a gnose das duas religiões fundamenta-se no mistério do Amor divino, observado em cada caso de acordo com o seu traço característico. O amor da teofania simultaneamente divina e humana, no Cristianismo, e o amor do Princípio ao mesmo tempo transcendente e imanente, no Islamismo.

Frithjof Schuon