Koyré (KPJB) – A linguagem de Boehme é poética

Boehme escreve como fala, e fala apenas como pensa, a fim de se expressar. Para ele, a palavra não é um aparato para notação conceitual; é a expressão viva de uma realidade viva que se forma e se determina no processo de expressão, e é por isso que todos os elementos do discurso (discurso falado) contribuem e devem contribuir para essa expressão: o som, a cadência da frase, a própria repetição, o ritmo mutável de imagens mutáveis e, à primeira vista, incoerentes. A linguagem de Boehme é poética; deve ser julgada como tal. Não é possível aplicar a ela as regras estritas de uma exposição escolástica; ele não quer dar ao seu leitor/ouvinte noções prontas; ele repete incansavelmente que é apenas dentro de si mesmo que se pode encontrar os elementos do conhecimento; que ele não quer “ensinar”, mas apenas provocar e sugerir os atos e atitudes mentais necessários para que a luz da verdade floresça na alma. Ele usa — e acreditamos que às vezes o faz deliberadamente — a magia das palavras (…). Esse caráter da obra de Boehme, que acabamos de delinear, torna particularmente difícil estudá-la e apresentá-la em um idioma que não é o seu; é quase impossível traduzir para o francês, sem distorcê-las, todas essas proposições intermináveis, abarrotadas de incidentes, que se acumulam, se sobrepõem e se emaranham, essa massa de imagens discordantes, de termos estranhos que agem na mente do leitor tanto pelo som das palavras quanto por seu significado, pelo valor afetivo, o halo emocional que está ligado a elas.

Jacob Boehme