Charles Williams (1886-1945)

LITERATURA — CHARLES WILLIAMS (1886-1945)

Para melhor compreendermos esses problemas (Mistérios Cristãos), podemos consultar uma obra similar, cuja espiritualidade tem, entretanto, tom diferente. Ela foi escrita por outro cristão, cujo pensamento profundo procurou também analisar a magia do tarô e sua superação religiosa. Seu título é The Greater Trumps (isto é, “Os grandes arcanos” do Tarô); o autor é CHARLES WILLIAMS (1886-1945), o misterioso amigo erudito de T. S. Eliot, C. S. Lewis, Tolkien e Dorothy Sayers. Quando esse escritor em romance anterior intitulado The Place of the Lion (1933), introduz bruscamente ideias platônicas como poderes no mundo dos fenômenos, tudo passa a depender da reação dos seres: se um é tomado de angústia louca, outro se abisma na adoração extática, outro é dominado por rapacidade arrebatada, visando à dominação do mundo a partir da ideia, enquanto um último adota a única atitude adequada, a de abandonar-se livremente — seja qual for a hegemonia cósmica dos poderes — à sua graça intrínseca. O livro The Greater Trumps (1950) descreve os princípios cósmicos do tarô, os quais, por pouco que apenas a magia queira servir-se deles, dispõem, em seu desencadeamento, de terríveis poderes destruidores do mundo, poderes que, quando, por fim, um amor totalmente desinteressado se coloca diante deles, são conjurados e submetidos ao seu senhor supremo.

Em Williams, como em nosso Autor, encontramos, em forma nova, a antiga sabedoria cristã que, lutando tenazmente desde os primeiros séculos contra todas as formas de fatalismo, especialmente contra a astrologia, em nome da soberania e da liberdade de Deus em face de todos os poderes cósmicos, não negou a existência de princípios terrestres secundários, que a providência põe a seu serviço para dirigir o curso das coisas. Lembremos uma vez mais a doutrina paulina, segundo a qual os “elementos do mundo” (venerados por muitos como poderes angélicos), as “dominações”, as “autoridades” e os “príncipes deste mundo” são reconhecidos em sua realidade e em sua competência, mas nem por isso são dispensados de ir na frente do carro triunfal de Cristo, submetidos que estão ao seu domínio (Cl 2,15). Williams mostra com muita evidência o mal que sofrerá o cristão — desejoso de explorar o campo de ação desses princípios secundários que constituem parte da realidade terrestre — se deixar desabrochar essa espécie de ciência sempre rigorosamente dentro do âmbito teológico. De qualquer forma, isso será infinitamente mais complicado do que quando se trata de transposições puramente conceituais do campo da filosofia não cristã para o da teologia. Mostra-o amplamente a história da astrologia em Bizâncio e no Ocidente em todos os séculos. Muitos são os que se comportam aqui como o aprendiz de feiticeiro e que são presos por suas práticas diletantes nas malhas de rede existencial que os priva da liberdade do cristão diante de Deus, essencial, antes de qualquer coisa, aos olhos dos Padres da Igreja. O comércio rendoso feito pela imprensa sensacionalista e pela literatura de baixo nível, com horóscopos totalmente inadaptados nos casos particulares, terminam por substituir a fé autêntica por superstição alucinante, quando, nesse domínio, seriam absolutamente necessários, além de formação especializada e de séria responsabilidade moral, como que um sexto sentido e um faro seguro dos limites do comunicável, como também reserva respeitosa diante do caminho religioso escolhido por cada um. (Prefácio de Hans Urs von Balthasar ao livro «Meditações Tarô»)