Zimmer
De acordo com o dharma hindu, a vida do homem divide-se em quatro etapas (asrama) estritamente diferentes. A primeira é a do estudante, “aquele que deve ser ensinado” (sisya), “aquele que atende, serve e acompanha seu guru” (antevasin). A segunda é a do chefe de família (grhastha), que constitui o grande período da maturidade e do exercício de seu devido papel no mundo. A terceira é a do retiro à floresta para dedicar-se à meditação (vanaprastha). E a quarta refere-se ao sábio errante e mendicante (bhiksu). Moksa é para estes dois últimos, não para o primeiro nem para o segundo.
Grama, “o povoado”, e vana, “a floresta” se opõem reciprocamente. Para o âmbito de grama foi dado aos homens “o grupo de três” (trivarga) e os manuais dos fins e metas próprios da vida mundana; mas no que diz respeito a vana — a floresta, o eremitério, a ação de livrar-se desta carga terrena de objetos, desejos, deveres e tudo o mais — o homem necessita de outras disciplinas, de outro caminho, de outros ideais, técnicas e experiências de liberação. Tanto os negócios, a família, a vida secular, como as belezas e esperanças da juventude e os sucessos da maturidade são agora deixados para trás: apenas a eternidade permanece. E para ela a mente se dirige, não mais às tarefas e atribulações desta vida que vieram e se foram como um sonho. [Zimmer]
Henri le Saux
ashrama (âshram) : a palavra significa primitivamente “pena” (resultante dos exercícios religiosos), daí o duplo sentido:
a) lugar desses exercícios, habitação de “religiosos”, eremitério, ” âshram “;
b) modos de vida (sob o aspecto religioso). São os “modos” ou “estados” por que passa teoricamente a vida bramânica. São em número de quatro:
1. o brahmacarya, a vida de estudante (cf. guruku-lam), na qual o jovem brâmane entra pela recepção do cordão sagrado (cerimônia da upanayna, que o torna um dvija, um nascido duas vezes, um renascido). Como esse estado comporta obrigatoriamente a castidade, o termo brahmacarya (concreto: brahmacarin) chegou a designar normalmente o estado de absoluta continência. Brahmacarin. aplica-se particularmente aos noviços.
2. o grhasta, estado de senhor de casa, chefe de família, no qual se entra pelo casamento (vivaha). O grhasta tem o dever de fundar uma família e de perpetuar a raça, de assegurar a continuidade dos ritos domésticos e de participar da vida social. Os cinco “grandes sacrifícios” (maha-yajnah) cotidianos do grhasta abarcam todas as suas obrigações para com o conjunto dos seres, ao mesmo tempo que o reconhecimento de suas dívidas para com eles. São: o brahma-vajna, estudo e ensino das Escrituras; o deva vajna, oferendas rituais aos deva (habitantes do mundo dos deuses), “moderadores” do universo (cf. a concepção dos anjos encarregados das estrelas, dos planetas, etc.) ; o pitr-yajna, oferendas aos pitr (habitantes do mundo dos pais), aos manes dos antepassados, para ajudá-los a penetrar nos céus superiores; o bhuta-yajna, oferendas de alimentos aos habitantes dos mundos inferiores, colocados por isso sobre o solo, e de que se aproveitarão “animais, párias, insetos, etc.” (sic in Manusmrti) ; o manushya-yajna, sacrifício aos homens, que compreende a hospitalidade, a esmola e geralmente todas as obrigações em relação aos homens e à sociedade.
3. o vanaprastha, retiro para a floresta (vana), só ou com sua esposa; isto deveria fazer o brâmane “quando vê sua pele se enrugar e seus cabelos embranquecerem, e que contemplou o filho do seu filho” (Manusmrti).
4. o samnyasa, o estado “para lá de” (ati-acrama), mais, mesmo, do que quarto estado: “depois de ter passado na floresta a terceira parte de sua vida, continua a Matvusmrti, que o brâmane abandone todo apego e se vá errante, daqui e dali”.
Esses estados são normalmente sucessivos e muitos hindus ortodoxos insistem ainda hoje na obrigação de cumprir primeiro seus deveres de grhasta antes de renunciar (samnyas). Entretanto, fora aqueles que se entregam à vida ascética depois de criarem seus filhos e particularmente depois da morte de sua mulher — o que está longe de ser raro —, acentua-se em nossos dias a tendência, sobretudo entre os não-brâmanes, de “renunciar” desde a juventude. A renúncia, neste caso, supõe-se provir de um apelo interior irresistível: vidvat-samnyasin, diz-se, o “samnyasin que realizou” e portanto não é mais capaz de suportar a vida deste mundo.
yad ahar eva virajet
tad ahar eva pravrajet
no dia em que não tiver mais apego,
nesse dia deve partir errante (Jabalopanisad),
enquanto que o hindu que compreende o sanyâsa no fim da vida é considerado fazê-lo como vivitsa-samnyasin, “aquele que tem o desejo de realizar” (Cf. “status perfections acquisitae et status perfectionis acquirendae.”).