Frances Yates — Iluminismo Rosa-Cruz
Portanto, deveríamos procurar uma influência de John Dee nos manifestos rosa-cruzes? Sim, deveríamos, e sua influência deve ser neles encontrada sem sombra de dúvida. Farei agora uma breve exposição relativa às descobertas que serão desenvolvidas mais detalhadamente nos capítulos subsequentes.
O segundo manifesto rosa-cruz, a Confessio de 1615, foi publicado com um opúsculo em latim, chamado “Uma Breve Consideração da Mais Secreta Filosofia”. Esta “Breve Consideração” é baseada na Monas hieroglyphica, de John Dee, e grande parte dela consta, palavra por palavra, de citações da Monas. Essa dissertação está associada indissoluvelmente ao manifesto rosa-cruz que o sucedeu, a Confessio. E a Confessio está indissoluvelmente vinculada ao primeiro manifesto, a Fama, de 1614, cujos tópicos nela se repetem. Assim, a “mais secreta filosofia” por trás dos manifestos era a filosofia de John Dee, conforme sintetizada em sua Monas hieroglyphica.
Além disso, a obra Chemical Wedding, de 1616, da autoria de Johann Valentin Andreae — na qual ele ofereceu a manifestação alegórica e romântica dos assuntos dos manifestos — tem, na página do título, a “monas”, o símbolo de Dee, que é repetido no texto, ao lado do poema com o qual inicia a alegoria.
Consequentemente, não pode haver dúvidas de que deveríamos considerar o movimento oculto sob as três publicações rosa-crucianas, como sendo definitivamente proveniente de John Dee. Sua influência poderia ter entrado na Alemanha vinda da Inglaterra com os amigos ingleses do Eleitor Palatino, e poderia ter-se expandido da Boêmia, onde Dee propagara a sua missão inspiradora nos anos anteriores.
Por que deveriam essas influências ter sido anunciadas desse modo estranho, através de sua difusão nas publicações rosa-crucianas? Como uma tentativa para responder a essa pergunta — sobre a qual os capítulos subsequentes fornecerão mais evidência — deve ser lembrado que as publicações rosa-crucianas pertencem aos movimentos em torno do Eleitor Palatino, movimentos esses que o estavam fortalecendo para a aventura da Boêmia. O principal espírito estimulante, por trás desses movimentos, foi Christian de Anhalt, cujas ligações na Boêmia pertenciam diretamente aos círculos nos quais a influência Dee teria sido exercida e fomentada.
A sugestão estranhamente excitante é que o movimento rosa-cruz, na Alemanha, representou o resultado retardado da missão de Dee na Boêmia vinte anos antes, cujas influências vieram a ser associadas com o Eleitor Palatino. Sendo Cavaleiro da Jarreteira, Frederico herdara o culto da cavalaria inglesa inerente ao movimento, e como chefe da União Protestante ele representava as alianças que Anhalt estava tentando fortalecer na Alemanha. Do ponto de vista político-religioso, o Eleitor Palatino atingira uma situação preparada nos anos anteriores, e surgira como o líder político-religioso destinado a resolver os problemas do século. Durante os anos de 1614 a 1619 — aqueles do entusiasmo veemente originado pelos manifestos — o Eleitor Palatino e sua esposa reinavam em Heidelberg, e Christian de Anhalt estava elaborando a aventura do povo da Boêmia.