zodíaco pitagórico

Citaremos, acompanhando-o das explicações e retificações necessárias, o resumo dos dados pitagóricos expostos pelo sr. Jérôme Carcopino: “Os pitagóricos, diz ele, construíram toda uma teoria sobre as relações do Zodíaco com a migração das almas. A que data ela remonta, é impossível saber. A verdade é que até o segundo século da nossa era, ela se difundia nos escritos do pitagórico Numênio, os quais nos é permitido conhecer por um resumo seco e tardio de Proclo, em seu comentário à República de Platão, e por uma análise, ao mesmo tempo mais ampla e mais antiga, de Porfírio aos capítulos XXI e XXII de De Antro Nympharum”. Há aí, como podemos notar de imediato, um belo exemplo de “historicismo”: a verdade é que não se trata, de forma alguma, de uma teoria “construída” mais ou menos artificialmente, em tal ou qual data, pelos pitagóricos ou por outros, como se fosse uma simples consideração filosófica ou uma concepção individual qualquer. Trata-se de um conhecimento tradicional, referente a uma realidade de ordem iniciática e que, precisamente em razão de seu caráter tradicional, não tem e nem pode ter uma origem cronológica assinalável. É claro que essas considerações podem escapar a um “erudito”; mas uma coisa é possível compreender: se a teoria em questão foi “construída pelos pitagóricos”, como explicar que ela se encontre por toda parte, fora de qualquer influência grega, e em especial nos textos védicos, que sem dúvida são muito anteriores ao pitagorismo? Isso também o sr. Carcopino, enquanto “especialista” da antiguidade greco-latina, pode infelizmente ignorar; porém, de acordo com o que ele próprio relata a seguir, tal dado já se encontra em Homero. Portanto, mesmo entre os gregos, ela era conhecida, não apenas antes de Numênio, o que é evidente, mas antes do próprio Pitágoras. Trata-se de um ensinamento tradicional, transmitido de modo contínuo através dos séculos, e pouco importa a data talvez “tardia” em que certos autores, que nada inventaram e nem tiveram essa pretensão, o formularam por escrito de um modo mais ou menos preciso.

Dito isso, voltemos a Proclo e Porfírio: “Nossos dois autores concordam em atribuir a Numênio a determinação dos pontos extremos do céu, o trópico de inverno, sob o signo de Capricórnio, e o trópico de verão, sob o de Cáncer, e em definir (evidentemente, segundo ele e os “teólogos” que cita e que lhe serviram de guias) Câncer e Capricórnio como as duas portas do céu. Quer para descer na geração, quer para tornar a subir até Deus, as almas deviam pois necessariamente transpor uma delas.” Por “pontos extremos do céu”, expressão por demais elíptica para ser perfeitamente clara em si mesma, é preciso entender aqui os pontos extremos alcançados pelo Sol em sua marcha anual e onde, de algum modo, ele se detém; daí o nome “solstícios”. É a esses pontos solsticiais que correspondem as duas “portas do céu”, de que trata a doutrina tradicional que já conhecemos. Como já indicamos em outra ocasião, esses dois pontos eram às vezes simbolizados — por exemplo sob o trípode de Delfos e sob os pés dos corcéis do carro solar — pelo polvo e o delfim, que representam respectivamente Câncer e Capricórnio. Sem dúvida, por outro lado, os autores em questão não puderam atribuir a Numênio a determinação dos pontos solsticiais, que eram conhecidos de todas as épocas. Simplesmente referiram-se a ele como um dos que haviam falado antes sobre o assunto, do mesmo modo que o próprio Numênio fizera referência a outros “teólogos”. (Guénon)

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