Quando o poder da ser/estar-ciente [awarenesss] dá origem a um senso de separação entre sujeito e objeto, com todas as limitações consequentes que impõe a si mesmo, este poder é chamado de ‘Māyā’. Como Māyā, encobre a consciência [consciousness] e obscurece o ser/estar-ciente do sujeito individual de sua unidade essencial. Enquanto o Vedānta não dualista sustenta que Māyā é um princípio indefinível que dá origem à ilusão cósmica da multiplicidade falsamente sobreposta à unidade indivisa do absoluto, de acordo com o Śaivismo da Caxemira, Māyā é o poder do absoluto de aparecer em diversas formas. A separação entre sujeito e objeto é o produto de um ato criativo e não de uma ilusão:
A variedade de sujeitos e objetos com suas diferenças características é manifestada pelo poder criativo do Senhor, que os conhece.
A liberdade criativa (svātantrya) do absoluto e seu poder ilusório de Māyā são idênticos. Quando se reconhece que o poder da consciência é a expressão espontânea do absoluto que se manifesta na variedade de formas que assume sem comprometer sua unidade essencial, ele é experimentado como a vibração pura (spanda) de sua liberdade. Se, no entanto, a efusão cósmica (yiśvollāsa) da consciência é sentida como consistindo de elementos diversos e conflitantes, o mesmo poder é chamado de Māyā. O campo de operação da liberdade do absoluto é o reino da consciência universal, enquanto o de seu poder de Māyā é o mundo da existência transmigratória. A diferença entre eles se baseia no grau de insight que temos sobre a natureza da realidade. Devido a esse poder, o objeto parece ser projetado fora do sujeito, embora esteja sempre manifestado dentro dele e seja a realidade interna do objeto. A criação da diversidade é, portanto, definida como “a projeção (ksepa) da própria natureza no Si a partir do Si”. Abhinava explica:
A criação é fazer com que aquilo que brilha internamente se manifeste externamente enquanto ainda preserva sua natureza interna original. Portanto, [o objeto] deve ser manifestado por aquilo em relação ao qual se diz que é interno e que torna o interno manifesto externamente.
Por outro lado, a destruição momento a momento do conteúdo objetivo da consciência ocorre por uma inversão do movimento do interno para o externo. O objeto, em outras palavras, nunca é destruído, mas meramente retirado para a realidade interna do sujeito. Os ensinamentos do Spanda concordam com a doutrina budista da momentaneidade apenas na medida em que aplica-se à objetividade exterior. Embora a percepção e todas as ocorrências fenomênicas possam ser analisadas em uma série de momentos (ksana), a vida diária não pode ser inteiramente compreendida em termos de tais unidades de momento. A mudança é uma atividade dentro do absoluto que só pode ser compreendida adequadamente em termos de ação consciente e não como um processo mecânico. Cada ato é parte de um único movimento contínuo que procede do agente — o Ser puro da consciência introvertida — até sua conclusão final no resultado, que é o objeto ou ação (kārya). A realidade externa do Devir é o efeito que emerge da causa, a realidade interna do Ser, assim como a ação emerge do agente. É uma onda de atividade que surge do potencial infinito do agente. Todo evento é uma parte do ritmo maior do evento cósmico total. Todo objeto é parte do objeto universal e todo sujeito participa da agência do sujeito universal. Ksemarāja escreve:
Portanto, o Senhor cria e destrói apenas o aspecto objetivo do percebedor, ou seja, o corpo, etc., mas não o aspecto subjetivo, que é a luz da consciência do “eu”, porque, embora encarnado, o sujeito é, na realidade, um com o Senhor. Assim, entre os dois — sujeito e objeto — o último é perecível, enquanto o primeiro é a liberdade da consciência e é imortal. Pois mesmo quando o mundo é emanado e absorvido, [o sujeito] não se afasta de sua verdadeira natureza. Se ele fizesse isso, a emanação e a absorção do mundo não seriam manifestas [pois não haveria ninguém para percebê-las].