Ibn Arabi (Fusus) – Abraão

VIDE: SABEDORIA DOS PROFETAS

A SABEDORIA DO AMOR RAPTOR NO MUNDO DE ABRAÃO [AustinFusus]

  • O título deste patriarca é Al Kalil = o amigo
  • Leitura como originário da raiz khalla = permeação ou penetração
  • Abraão = o permeado por Deus
  • Como o amor raptor a amizade é uma intimidade
  • Princípio da divina permeação
  • Permeação mútua DeusCosmos

O título tradicional do Patriarca Abraão é al-Khalil, que geralmente é traduzido como “o amigo”. Ibn Arabi, entretanto, lê na palavra um dos outros significados derivados da raiz khalla, o de permeação ou penetração. Assim, nesse contexto, o título de Abraão significa, antes, “o permeado”, permeado, isto é, por Deus. A amizade, portanto, é do tipo mais íntimo; de fato, é, como sugere o título do capítulo, mais como um amor arrebatador pelo qual o amante é totalmente permeado pelo amado. Nosso autor continua a usar o exemplo de Abraão para ilustrar o princípio da permeação divina em geral. Assim, o Cosmos e cada um de seus constituintes, por serem totalmente receptivos ao Comando divino, são totalmente permeados pelo agente divino como algo implícito e não explícito, de modo que a complexidade e a multiplicidade manifestas do Cosmos ocultam a realidade onipresente de Deus. Como de costume, entretanto, ele insiste na mutualidade desse princípio de permeação, uma vez que, assim como Deus está implicitamente presente na criação cósmica, a criação está implícita e essencialmente presente em Deus.

Isso leva Ibn Arabi a apontar que os termosDeus” e “Cosmos” são interdependentes, sendo a noção de divindade dependente da noção daquilo que O adora. Assim, nem Deus nem o Cosmos podem ser conhecidos, exceto em relação um ao outro. Ele está dizendo, portanto, que o Cosmos não pode ser adequadamente conhecido ou compreendido sem referência a Deus, nem o conceito de divindade pode ser compreendido sem referência à criação. Prosseguindo com o assunto de nossa latência essencial in divinis, ele conclui que, ao conhecer o Cosmos, Deus está conhecendo a Si mesmo, e que, ao conhecer Deus, nós, como criaturas, conhecemos a nós mesmos em essência. Assim, in aeternis, somos o conteúdo latente e essencial de Seu conhecimento de Si mesmo, enquanto que, no tempo e no espaço, Ele é a substância e a realidade que permeia tudo, da qual somos apenas facetas aparentes. Isso o leva a salientar que, em vista disso, não temos motivo para culpar Deus, uma vez que, na realidade, como não sendo nada além do que Ele sabe que é, nós determinamos o que experimentamos ser, passado, presente ou futuro.

Ibn Arabi continua a reforçar o conceito de permeação mútua entre Deus e o Cosmos, comparando-o com o processo pelo qual o alimento consumido se torna um com o consumidor pela assimilação de suas partículas e substâncias à substância de quem o come. Assim, a divindade é o alimento existencial do Cosmos, enquanto ele, por sua vez, é o alimento arquetípico da autoconsciência divina. De fato, os dois poemas com os quais ele conclui este capítulo expressam muito explicitamente sua ousada visão da mutualidade, e foi esse tipo de expressão, de sua parte, de conceitos chocantes e inaceitáveis para mentes menos flexíveis, que rendeu a Ibn Arabi tanto opróbrio entre os estudiosos religiosos de sua época.

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