Gordon: Isolamento Eu

ANIMALIDADE — ISOLAMENTO DO EU HUMANO

Pierre Gordon: A REVELAÇÃO PRIMITIVA

Cindido parcialmente do Ser, o homem não pode assim juntar-se a nenhum ser. A fissura devida ao desnivelamento de origem, sempre o contém. Ele vive isolado nele mesmo. Cada um de nós forma um mundo aparte, um cosmo inteiramente fechado, e não podemos compreender outro senão em substituindo nosso cosmo em seu, quer dizer em começando por tudo embaralhar e falsificar. Quais quer que sejam nossos esforços, não poderíamos evadir de de nós mesmos; a cisão original, inexoravelmente, se interpõe. Os sentimentos e as ideias que colocamos nos outros são nossos sentimentos e nossas ideias. Vivemos sós; sofremos sós; sós, retornamos ao pó. De uma ponta à outra de nossa vida terrestre, estamos murados em nós, como em um túmulo. É a morte que nos libera. E este implacável enterro de cada indivíduo em um sepulcro do qual não pode remover a pedra é sem dúvida, para a humanidade, o resultado mais terrível da ocultação primitiva.

Esta solidão reforça a princípio inelutavelmente o egoísmo. Pode-se mesmo dizer que ela o constitui. O ser mais amante e mais próximo de nós se ama através de nós mesmos como nos amamos através dele. Não há pio irracionalidade, certamente, que de se fazer centro, mas como disso escapar, posto que a mente se encontra reduzida a pastar sobre ela mesma? Fazemo-nos centro na medida em que somos incapazes de juntar-se à existência, e os Eu inteiramente desprovidos de ser reconduzem totalmente a eles o universo.

Nosso pensamento, do fundo de sua fossa, não pode, em definitivo, nada entrever senão formas superficiais e ilusões passageiras, que, sendo um jogo de sensações, — e de sensações que são nossas sensações — não tardam à desencantar, a supor que elas chegam um instante a divertir. Só nos seria abordável o super-homem, o homem verdadeiro, o homem no qual o homem foi recriado, e que possui, a exemplo do ser humano primitivo, o poder de superar seu pensamento e de penetrar no coração dos seres. Para este homem somente somos permeáveis; a ele somente somos acessíveis; ele só pode nos retirar fora de nossa masmorra, nos arrancar da solidão e do egoísmo, nos reabrir o mundo encantado onde a alma abraça outra coisa que ela mesma, onde ela, é livre, e acede ao amor. Ele somente, em uma palavra, nos oferece as chaves do ser. Mas, não sabemos esticar os braços para dela beneficiar. A porta de saída está totalmente no fundo de nós mesmos, em direção da zona interior que confina radiância. Desaprendemos o caminho.

Pierre Gordon