É, de fato, uma nova revelação que Boehme acredita estar trazendo, uma revelação final dos grandes mistérios da criação. O termo “revelação” não deve nos surpreender muito. Para todo espiritualista, todo conhecimento do divino — pelo menos todo conhecimento original e verdadeiro — é uma revelação, um dom e uma inspiração do Espírito Santo. Além disso, é necessariamente um renascimento, um nascimento espiritual. A doutrina é constante: é somente o espírito que pode ver e tocar o espírito. É o Logos, encarnado na alma, que lhe traz o conhecimento de Deus.
Entretanto, não é exatamente assim que Boehme entende. A luz do segundo nascimento não se refere apenas a Deus. Da mesma forma — e talvez até mais — ela diz respeito à natureza. Deus, revelando-se na alma, ao mesmo tempo revela a ela sua própria revelação na natureza, e a alma regenerada adquire assim a capacidade de vê-lo no mundo, presente e expressando-se no sensível. O espírito penetra na carne, vivifica-a, transforma e vivifica os sentidos e os devolve ao seu propósito original: ser órgãos e servos do espírito.
Na doutrina clássica do espiritualismo, a oposição entre “a carne” e “o espírito”, “o espírito” e “a letra”, levava diretamente a uma dissociação do ser humano, como mostramos em outro lugar, com os Schwenkfelds e os Franks; Boehme quer, acima de tudo, preservar e salvaguardar a unidade do ser humano. É somente no espírito, afastando-se dos sentidos e da percepção sensível, afastando-se do “mundo externo”, no interior da alma, que a doutrina espiritualista, herdeira do misticismo alemão da Idade Média, busca o conhecimento de Deus. Boehme também sabe disso: para alcançar esse segundo nascimento, para vivificar e despertar dentro de si aquela centelha divina que vem de Deus, é preciso “morrer” para o mundo e para si mesmo. Mas uma vez que o “espírito” tenha se apossado “naturalmente” do corpo, ele se torna sua expressão e, no mundo dos corpos, ele percebe o espírito se expressando.