E.J. Holmyard, A Alquimia [EJHA]
Durante, aproximadamente, os três mil anos que precederam a primeira aparição definida da alquimia, no último par de séculos antes de Cristo, a acumulação dos conhecimentos técnicos teve tais progressos que algumas das descobertas dos antigos artífices nunca foram ultrapassadas. Foram inventadas ligas coloridas de metais e pedras preciosas artificiais, começou a fabricar-se o vidro e descobriram-se as úteis propriedades de muitas plantas e minerais. Mas toda essa familiaridade com os objetos materiais, e as alterações que neles se efetuavam, não implicou uma separação, daquilo que nós chamamos hoje técnica, de todos os outros aspectos da vida diária. As operações dos artífices eram levadas a cabo para acompanhar as práticas religiosas ou mágicas e supunha-se existir conexões várias entre metais, minerais, plantas, planetas, o Sol e a Lua e muitos deuses. Assim, na Babilônia, relacionava-se o ouro com o Sol e com o deus Enlil, enquanto a prata se ligava à Lua e ao deus Anu. As considerações de natureza astrológica adquiriram enorme importância, e pelos séculos VI e V a. C. já tinha sido elaborada uma completa ciência de astrologia. Desde aí muitos dos ofícios degeneraram em alquimia, particularmente metalurgia e tinturaria, influenciando essas atividades as crenças astrológicas de tal forma que sobre elas vale a pena dedicar mais demorada atenção; com as operações que levaram a cabo, os alquimistas satisfizeram também muita da especulação astrológica.
Em primeiro lugar a astrologia realça a harmonia entre o macrocosmo, ou Universo, e o microcosmo, ou homem; tudo o que se passou no Universo teve a sua influência exterior e o seu paralelo intrínseco com o homem. Acreditava-se que a alma humana entrava no corpo por meio de uma estrela especial e, na altura da morte, voltava ao céu pelo mesmo processo. Os signos do Zodíaco, considerados então doze, tiveram um significado mágico e foram usados para delinear os horóscopos, não apenas para os homens, mas também como meio de descobrir as condições favoráveis para levar a cabo a preparação de certa droga ou liga. Os cálculos necessários na realização do horóscopo exigiam muitas vezes o uso de números místicos, tais como quadrados mágicos, e assim apareceu um tipo de numeração esotérica. Tal numerologia foi mais tarde desenvolvida por Pitágoras (cerca de 530 a. C.) e frequentemente encontrada em tratados de alquimia (pp. 39 e 79).
Com os gregos, no século IV a. C, a astrologia era ainda olhada como reguladora de todos os acontecimentos do Universo, como já tinha sido na antiga Mesopotâmia, mas, a despeito de os astrólogos da Babilônia terem dado lugar de honra à Lua entre os corpos celestes, os gregos deram precedência ao Sol. A Lua e os cinco planetas então conhecidos estavam relacionados, cada um deles, com um deus especial, e eram dotados das características desse deus; nesse sistema o planeta avermelhado foi chamado Marte, o deus da guerra, e astronomicamente governava os assuntos de natureza bélica, enquanto o planeta apelidado Vénus era senhor em assuntos de amor. Foi também adotada a velha ideia de que os planetas estavam interligados com metais, e por isso o Sol, a Lua, Marte, Mercúrio, Vénus, Júpiter e Saturno eram muitas vezes usados para, metaforicamente, significar ouro, prata, ferro, mercúrio, ou prata-viva, cobre, estanho e chumbo.
Além da astrologia, outras ciências filosóficas foram então progressivamente cultivadas. Físicos e pensadores gregos visitaram os centros de conhecimento na Mesopotâmia e na Pérsia e regressaram com ideias, não apenas originárias desses centros intelectuais, mas também provenientes de outros visitantes vindos de direção oposta, nomeadamente da índia, Ásia Central e mesmo da China. Todas estas matérias foram posteriormente trabalhadas e desenvolvidas por grandes filósofos, como Platão e Aristóteles, e de tal forma se impuseram ao pensamento grego que vieram a afetar, desde aí, de forma radical a civilização ocidental.