No capítulo anterior, encontramos o conceito de Comando Celestial (t’ien ming). O conceito é filosoficamente de importância básica porque leva diretamente à ideia de determinismo que, no pensamento ocidental, é conhecido como o problema da “predestinação” e, na tradição intelectual do Islã, como o de qada e qadar.
A parte mais interessante de todo o problema é reconhecidamente sua profunda implicação teológica no contexto de religiões monoteístas como o cristianismo e o islamismo. O problema teológico pode, à primeira vista, parecer bastante estranho à visão de mundo de Lao-tzu e Chuang-tzu. No entanto, esse não é o caso, mas ficará claro se lembrarmos que o taoismo também tem seu próprio aspecto teológico.
Nos capítulos anteriores, o Caminho ou o Absoluto foi abordado quase que exclusivamente do ponto de vista metafísico. Em outras palavras, tentamos analisar o aspecto metafísico do Caminho. E com razão. Afinal de contas, esse é o tema mais fundamental sobre o qual se baseia todo o sistema da filosofia taoista.
Mas o Caminho, conforme concebido pelos filósofos taoístas, não é simples e exclusivamente a base metafísica de todos os seres. Ele também é Deus — o Criador (lit. o Fazedor-de-coisas, tsao wu che), o Céu (t’ien) ou o Imperador Celestial (t’ien ti), como é tradicionalmente chamado em chinês. A imagem “pessoal” do Absoluto na China antiga teve uma longa história antes do surgimento do ramo filosófico do taoismo que estamos considerando neste livro. Era uma tradição viva bastante vigorosa e exerceu uma tremenda influência na formação histórica da cultura e da mentalidade chinesas. E cometeríamos um erro fatal se imaginássemos que o Caminho, tal como concebido — ou “encontrado”, melhor dizendo — pelos sábios taoístas, fosse um Absoluto puramente metafísico. Para eles, o Caminho também era um Absoluto metafísico, bem como um Deus pessoal. A imagem do Criador das coisas não deve ser tomada como uma expressão metafórica ou figurativa para o Princípio metafísico. Chuang-tzu tem um capítulo intitulado “O Grande Mestre Senhorial”. O título se refere a esse aspecto “pessoal” do Caminho.