Julius Evola — A DOUTRINA DO DESPERTAR
HEREDITARIEDADE
Quanto à relação existente entre os três princípios, encontra-se nos textos esta comparação: a consciência — vinnana — é a semente; a terra é o kamma (karma); a água que faz crescer, da semente, a planta, é a sede. O kamma, aqui, corresponde à força, pré-formada pelos sankharas determinados, próprio à «entidade samsarica», na qual se imerge o princípio em descida (Semente) e que a concupiscência desenvolve em uma nova existência. Só em tais casos de «descidas» excepcionais, «fatídicas», relativas a seres que, tendo eliminado a ignorância em uma certa medida, são essencialmente feitos, em sua substância, de «iluminação» (bodhi — tal é o sentido literal da expressão bodhisattva), o «veículo», escolhido como entidade de concupiscência em lugar do antarabhava, é um «corpo celeste» ou um «corpo de esplendor» — tusito-kayo. Em tais casos, o nascimento advirá sem uma verdadeira solução de continuidade da consciência, com uma «lembrança» mais ou menos precisa, em perfeita posse de si, com imperturbabilidade e visionariedade, em companhia de uma verdadeira escolha do lugar, do tempo e da mãe em que se realizará a encarnação.
Tais vistas relativizam a amplitude da hereditariedade biológica terrestre. Enquanto hereditariedade, é aqui, tomado em consideração algo muito mais amplo: não somente aquela que se herda dos próprios ancestrais, mas ainda a que provém de si mesmo, de ações e de identificações pré-natais. Mais ainda, isso, na hereditariedade global, constitui a parte mais essencial. De um ponto de vista superior, fazer abstração desta hereditariedade não-biológica seria tão absurdo quanto imaginar que pintos de espécie diversa nascessem somente do ovo sem uma correspondente e diversa hereditariedade animal. Retomando o simbolismo da combustão, seria absurdo, querendo encontrar a origem do fogo que se amparou de uma camada, subir à origem desta camada, à árvore da qual ela provém, à floresta à qual esta árvore pertence, e assim por diante — tudo isto explicando além do mais a qualidade de combustível desta matéria dada. A origem do fogo deve ser, ao contrário, investigada sobre a pista do fogo ele mesmo, e não da madeira, em se referindo a faísca que acendeu esta chama, em depois à chama a qual pertenceria esta faísca, e assim por diante. Similarmente, a hereditariedade mais essencial e verdadeiramente «direta» de um ser não se encontra ao longo da linha genealógica dos genitores terrestres — e deve-se dizer que os seres são herdeiros e filhos de suas ações, e não de um pai e de uma mãe. Além da própria hereditariedade, enquanto corpo e soma, há a hereditariedade samsarica, e enfim, há aquela de si mesmo, enquanto princípio «do alto», envelopado pela «ignorância» («a composição vertical»).