Bugault (GBIP) – Antropologia Budista (1)

O esboço geral do Capítulo V nos deu uma ideia do lugar que o pensamento budista, em uma época ainda pré-científica, reservava à experiência e à razão. Agora proponho aplicá-lo a um problema que nos é familiar desde a era moderna, o da consciência pessoal: primeiro na companhia dos filósofos por meio do tema do Cogito e, depois, por meio da explicação que a neurofisiologia procura fornecer. O que um monge budista diria ao ler Descartes e Wittgenstein? Em princípio, ele teria alguma objeção à leitura de O Homem Neuronal? Como veremos, esse experimento mental leva a uma resposta que é tão instrutiva quanto inesperada, pois afrouxa o vínculo que geralmente estabelecemos entre religião e espiritualismo.

Antes de fazer isso, e para maior clareza, vamos relembrar alguns pontos que são essenciais para entender a concepção do budismo sobre o “ser” humano.

Originalmente, o budismo não era, estritamente falando, uma religião, mas sim uma disciplina psicossomática, principalmente para monges e, até certo ponto, para leigos. Essa disciplina é tripla: śīla, moralidade, samādhi, ou seja, concentração ou ioga, prajñā, traduzindo insight, acies mentis e, portanto, filosofia. Nenhum desses três componentes é separado dos outros dois.

No decorrer de sua evolução, o budismo se tornou uma religião, principalmente sob a influência dos leigos. Mesmo assim, não havia lugar para um Deus Criador ou para a Revelação; nem, como veremos em breve, para uma alma, humana ou divina. Tudo isso ainda é verdade hoje.

Por esse motivo, um budista se sente perfeitamente à vontade quando se depara com o desenvolvimento da ciência moderna ou com certas correntes da filosofia contemporânea no Ocidente, como o positivismo lógico ou as filosofias analíticas. Para entender isso, aqui estão algumas características comuns à abordagem budista e à abordagem científica.

Em primeiro lugar, a primazia metodológica dada à experiência e à razão. A característica distintiva da atitude budista, sem dúvida por ser terapêutica e médica, é o fato de ser uma análise redutiva: onde à primeira vista vemos a unidade, devemos procurar a pluralidade que a sustenta.

De modo mais geral, as teorias budistas do conhecimento postulam que toda unidade é uma síntese, e toda síntese é um trabalho da imaginação.

O segundo ponto de aproximação não é mais estático, mas dinâmico. Que eu saiba, a formulação mais antiga na literatura universal da ideia de lei ou função — que não deve ser confundida com causalidade transitiva ou metafísica — é encontrada nas antigas escrituras budistas, um pouco antes de nossa era. Assim, no Majjhima-nikāya, p. 63 :

imasmiṃ sati idaṃ hoti imassuppādā idaṃ uppajjati
imasmiṃ asati idaṃ na hoti imassa nirodhā idaṃ nirujjhati

“Isto sendo, isso é. Isto aparecendo, isso aparece.
Isto não sendo, isso não é. Isto cessando, isso cessa”.

É claro que, naquela época, essa relação permanecia qualitativa, ainda não havia sido quantificada. No entanto, foi uma contribuição importante para o desenvolvimento do conhecimento humano. Entre outras consequências, a morte foi entendida como um evento natural, livre de qualquer magia.

Mas há mais. Essa doutrina da coprodução condicionada (pratītya-samutpāda), ao mostrar que tudo o que vem à existência resulta de uma concorrência de causas e condições (hetu-pratyaya-sāmagrī), não poupa absolutamente nada. Isso também se aplica, antes de tudo, à personalidade humana, à ideia que temos de nós mesmos como um ser simples e independente, em suma, à ideia do eu. Deve-se notar, de passagem, que, além de Spinoza e, até certo ponto, Hume e Schopenhauer, a maioria dos pensadores ocidentais mal notou a contradição entre essa crença — a crença em um eu — e o Princípio da Razão Suficiente.

CONTINUAÇÃO

Buda, Guy Bugault