Pessoa: Philosopho Hermetico III

Fragmentos dos escritos do espólio de Fernando Pessoa, organizado por Pedro T. Mota, sobre o tema «ROSEA CRUZ».

27 10 M3 11 — Philosopho Hermetico

Assim o Novo Testamento … Ninguém se lembra de perguntar se as próprias interpolações, emendas, etc., com que nos chega não serão inspiradas também… Inspirados são todos e em tudo; depende a ciência real da consciência que dessa inspiração se tem.

A base da vida universal é o corpo, a coisa; a da vida social a palavra;

Para o philosopho hermetico os corpos não existem, e as palavras. ..

27 19 M3 — Hermetic Philosopher.

S. Paulo é a passagem do hermético para o literal. É a passagem evidente e clara. Não fala ele em mistérios?

E a arte do esconderijo? E a arte de envenenar? Onde estão essas duas artes medievais, e da renascença italiana? Perdidas. E talvez o senhor não sinta a origem delas, e a que se deve. Não sabe nem ficará sabendo. Eu sei mas não lho digo.

53A-97 (m)

Lentamente, se o ocultismo — oh, ilusão! — se estudar, vir-se-ão achando explicações e razões para atos em aparência produzidos por espíritos; mas es:e caso é o mesmo que o da transmutação de metais. Há dois modos de o fazer … (etc.)

A investigação é impossível porque, sendo paciente e científica encontra apenas o lado externo do fenômeno; sendo empírica e ligeira encontra-se em aparência duvidosa contra os factos, que parecem escapar-se-lhe para a falsidade.

53B-5 (m) — RosaCruz?

Shakespeare, (—), têm escritas coisas místicas. Mas eles próprios não as percebiam. Tinham intuições e transcreviam-nas, sem as compreender. É como o doido, que é inconsciente. O inconsciente é o possesso. Por isso é inconsciente.

À medida que a ciência se foi tornando social, foi-se perdendo.

O modo, o método pelo qual os scientes chineses fabricavam a pólvora, e sabiam movimentos de ginástica «Sueca» não é o método, o modo atual, visível, social, compreensível e aparente. Por isso não se tornou social a pólvora, e a tal ginástica. Só, desde quando descoberta, em se tornou a pólvora geral no ser conhecida, porque então chegara o momento evolucional de ela poder ser social; e o mesmo aconteceu com os movimentos ginásticos que Kuhne talvez não ignorasse1.

53A-98 (m) — R. Cruz

O mundo é uma vontade essencialmente. Em aparência é uma inteligencia. As ciências abertas são as que tem de seguir a ordem logica (i e da inteligencia), as ocultas as que seguem a da vontade — Cf. Lithé. Pref to Salverté 2 ed. pXXXIV

«Les anciens tournaient, toutes les sciences du coté de l’utilité …… Tout ce qui n’etait pas interessant pour la société, pour les arts était négligé. Ils rapportaient tout à l’homme moral, et ne croyaient pas que les choses qui n’avaient point de usage fussent dignes de l’occuper.

Bouffon: Discours sur la memoire des traités d’histoire naturele.

San Severo and his assumed discovery of un-burning lamps — Casual discovery.

A ciência oculta, não é saber certas coisas; é sabê-las ocultamente, i e, o modo oculto de as fazer.

Des Sciences Occultes par Eusèbe Salverte. 3 edition, introduction de E. Lithé Paris. Bailiére 1856.

Contains much reading.

Condorcet2.

Quételet:Physique social. 2v3.

Bailly — a sua curiosa teoria de uma humanidade pre-humana que soubesse uma ciência hoje quasi perdida4.

Notice Lithé’s preface to Salverte — on arts and sciences in ancient civilizations — arts are fragmentary, sciences systematic; arts of each time, sciences regular evolution in proposed environment; arts primitive, science not.

Science occulte: une disproportion totale entre le cause et l’effet.

(Td).

«Os antigos viravam todas as ciências para o lado utilitário … Tudo o que não fosse interessante para a sociedade, para as artes, era negligenciado. Referenciavam tudo com o homem moral, e não acreditavam serem dignas de o ocuparem as coisas que não tivessem qualquer uso.»

Bouffon: Discurso sobre a memória dos tratados de história natural.

San Severo e a sua suposta descoberta de lâmpadas que não se gastavam. — descoberta casual.

Reparar no prefácio de Lithé a Salverte — sobre as arte; e as ciências nas antigas civilizações — as artes são fragmentárias, as ciências sistemáticas; artes de cada época, ciências uma evolução regular num ambiente proposto; as artes primitivas, a não.

Ciência oculta: uma desproporção total entre causa e efeito.

53B-93 (m)

2 especies de magia (Lane. Modern Egyptians) ( = ) 2 espécies de ciência — ocultista e esotérica = Rosa Cruz.

133 G Ioo. (m)

O contacto com o oculto pode obnubilar, como pode elucidar. (O gênio, o louco-cf) (Espiritismo que os ocultistas desrecomendam). Ex-Sh-Bacon thesis.

O critério material da iniciação. Pode ser-se iniciado de nascença, ou iniciando. O gênio — o gênio de verdade que é uma iniciação orgânica e transcendente.

(A associação de ideias e a inteligência analógica)


Não criou Deus ao mundo, senão só ao mundo que criou


O passo do Evangelho sobre os que são eunucos (= iniciados) desde o ventre materno etc., confirma que pode haver iniciação do Destino, que se pode nascer iniciado, e cumprir inconsciente, ou quase, um destino oculto.

O gênio — ou certo gênio — como iniciação.

Shakespeare

(a preparação em uma vida para outra)

53A-59 (m) (p)

O Abade da Quintessencia.

O «Hamlet» como drama ritual ou simbólico. O espectro que desvia da rota.

53A-95. (m) (p)

3 ordens de Rosa Cruz — Cf. emoção, raciocínio, vontade.

Bacon e a R(osa) Cruz.


  1. Luis Kuhne, nascido na Suécia, publicou inúmeras obras sobre os métodos de medicina alternativa, que foram traduzidos e conhecidos em Portugal, desde os fins do século passado: «A Nova Ciência de Curar», 1896, baseada em banhos, alimentação natural, e com exclusão dos medicamentos e operações, «A educação das Crianças», 1896. 

  2. Marie Jean Caritat, Marquez de Condorcet, nascido em 1743, foi um gênio penetrante, tendo-se distinguido na matemática, na filosofia e na literatura. Membro da Academia Francesa, contribuiu para a revolução americana e francesa, tendo ocupado vários cargos, até cair em desgraça e ser morto. Com Court de Gebelim, fez parte da Loja dos Amigos Reunidos, os «Philaletos», de Paris, ligada a Martinés de Pascoales. 

  3. Quételet (1796-1874), astrônomo belga, tradutor de episódios de «Os Lusíadas», tendo escrito sobre o desenvolvimento das faculdades humanas. 

  4. Jean S. Bailly (1736-1793), ensaísta e historiador, Presidente da Academia Francesa, e executado pelos jacobinos. As obras mais importantes são «A História da Astronomia» e «Os Ensaios sobre a origem das fábulas e das religiões antigas». 

Fernando Pessoa (1888-1935), Hermetismo – Ciências Tradicionais