Attar — O Livro da Provação (Musibatnama)
Excertos e resumo da tradução francesa de Isabelle de Gastines, Le Livre de l’épreuve, publicado pela Fayard em 1981 [ALP].
Segundo a apresentação, esta seria a principal obra de Attar que relata em quarenta capítulos a viagem iniciática da alma na demanda da Unidade. No curso de um longo périplo, por vezes poético e místico, o peregrino que a encarna interroga todo o criado: potências da terra e do céu, anjos, nuvens, ventos, animais e plantas, sobre a via a seguir para alcançar Deus. Cada etapa é pontuada de anedotas saborosas e ricas de sentido espiritual, onde o amor tem grande presença.
Trata-se da primeira tradução em língua ocidental, dado que os orientalistas franceses foram os primeiros a chamar a atenção dos leitores ocidentais sobre este grande poeta sufi. Em 1819, Sylvestre de Sacy editava e traduzia o Pandnama (o Livro dos Conselhos) e em 1857 o infatigável Garci de Tassy editou o Mantiq at-Tayr (A Linguagem dos Pássaros), que traduziu em seguida. Esta história de trinta pássaros, si morgh, que ao fim de sua peregrinação descobrem sua identidade no Pássaro Divino, o Simorgh, fascinou milhares de leitores no Ocidente.
Meio século mais tarde à primeira edição da Linguagem dos Pássaros, foi publicada por R.A. Nicholson e M. Qazwin a surpreendente obra hagiográfica de Attar, o Tadhkirat-al-Awliya (O Memorial dos Santos). Fonte de informações por muitos anos a fio sobre a vida dos grandes sufis do passado, e em particular de Hallaj, que é considerado um dos iniciadores de Attar.
No Livro da Provação, Attar no auge de sua maestria poética (a palavra shi’r, “poesia”, não é feita das mesmas consoantes que as palavras shar’, “Lei Divina”, e ‘arsh “Trono Divino”, se pergunta Attar neste livro), descortina uma sucessão de historietas “divinas”, como o fluxo de um rio que atravessa montes e vales, até uma vasta planície, reunindo em seu curso córregos — lendas populares, histórias sufis, relatos místicos. Seu relato no Livro da Provação, enquanto um grande rio, toma seu herói, sua própria alma, até atingir o Oceano de Si, lugar onde a alma e Deus estão finalmente unidos segundo o velho adágio sufi: “Aquele que se conhece a si mesmo, conhece seu Senhor”.
A imagem do peregrino foi utilizada por Attar com muita felicidade, sendo suas obras como exteriorizações da tariqa, a Via, que o murid, o discípulo, deve percorrer lentamente, com precaução; ou como a espiritualização do rito principal do Islã, a peregrinação para meta última, a Ka’ba das almas. É a viagem da alma apaixonada que se deve empreender. (adaptado e resumido da introdução de Annemarie Schimmel)