VIDE budismo tântrico; budismo chinês; budismo coreano; budismo japonês; budismo tibetano.
Após o seu funeral (parinirvana), a sucessão do Buda à frente de samgha fica a cargo de Mahakasyapa, e não de Ananda, o discípulo fiel que por ter estado vinte e cinco anos ao serviço do Iluminado, nunca tinha tido tempo de estudar as técnicas de meditação e de se tornar um arhat, isto é, um ser que atingiu o nirvana e que não voltará mais ao ciclo das reencarnações. Quando Mahakasyapa convoca os arhats para o Concílio de Rajagrha, Ananda não é convidado. Recolhendo-se na sua solidão, ele passa a dominar rapidamente as técnicas do ioga e torna-se ele próprio um arhat. Questionado por Mahakasyapa, Ananda recita os sutras enquanto o discípulo Upali formula as regras da disciplina (vinaya).
Qual teria sido, segundo os veneráveis documentos, a forma original da pregação do Buda?
Contrariamente ao que muitos estudiosos possam ter dito, o budismo não é «pessimismo». Na sua origem, trata-se de uma doutrina muito característica no conjunto das religiões do mundo, uma doutrina não afirmativa, mas primeiramente negativa. O caminho do budismo é o caminho da desvalorização do Eu e, consequentemente, do mundo dos fenômenos. As certezas que o Buda permite, na sua exemplar desconfiança, em relação a todo o discurso metafísico, são de natureza negativa; é por essa razão que aqueles que gostam do rigor da lógica puderam sentir uma certa afinidade entre o método de Buda e de certos neopositivistas, em particular Wittgenstein.
Neste sentido, o exemplo mais representativo é do monge Malunkyaputta (Majjhima Nikaya, sutta 63), perturbado pelo fato de o Buda pregar ao mesmo tempo «que o mundo é eterno e que o mundo não é eterno, que o mundo é finito e que é infinito, que a alma e o corpo são idênticos e que não são idênticos, que o arhat existe para além da morte, e que não existe para além da morte, que ele existe e não existe após a morte, que ele nem existe nem não existe…» Apresentando-se perante o Buda para que este lhe explique, obtém a seguinte resposta: «É como se um homem tivesse sido ferido por uma flecha envenenada e, quando os seus amigos e familiares procuravam um médico, esse homem dissesse: “Não retirarei a flecha antes de saber se aquele que me feriu é um guerreiro, um sacerdote, um vaisya ou um sudra… Qual é o seu nome e a que tribo pertence… Se é de estatura grande, média ou pequena… Se é negro, moreno ou loiro…”», etc.
Da mesma forma, quando o asceta itinerante Vaccha lhe apresenta todas as teses que acabamos de enunciar e as suas antíteses, tentando dar uma ideia da doutrina do Buda, este nega, por sua vez, as teses e antíteses, proclamando-se «livre de toda a teoria». Perante a perplexidade de Vaccha, que raciocina em termos de uma lógica simplista (se A não é verdade, então não-A é verdade), o Buda pergunta-lhe se ele seria capaz de responder à questão: Para onde é que foi um fogo extinto, para Este, Oeste, Sul, ou Norte? O reconhecimento da ignorância do seu interlocutor permite ao Buda comparar o arhat a um fogo extinto: toda a afirmação que diz respeito à sua existência será conjectural (Majjhima Nikaya, sutta 72).
Pelas mesmas razões que o levam à negação de toda a teoria, o Buda opõe-se à doutrina brâmane do Eu (atman) como elemento invariável do agregado humano, sem apesar disso afirmar o contrário, nomeadamente que a morte leva à extinção completa do arhat (cf. Samyutta Nikaya 22,85), pela simples razão de que o que se chama «arhat» sendo, como tudo o resto, uma simples convenção linguística (cf. Milindapanha 25), não se saberia dar-lhe uma existência real. E por isso que os únicos atores do universo são o sofrimento e a extinção:
Há só Sofrimento,
não há sofredor.
Não há agente, só há
a ação.
O Nirvana é, mas não
aquele ou aquela que o procura.
O Caminho existe, mas não aquele ou aquela que por lá vai.
(Visuddhi Magga, 16)
Recusando deixar-se envolver no caminho sem saída da especulação, a pregação do Buda visa essencialmente a salvação. Ao formular a lei da «produção condicionada» (pratitya samutpada; Samyutta Nikaya 22, 90), o Buda faz derivar todo o processo cósmico da Ignorância: «E a Ignorância (avidya) que produz a Informação inata (samskara); é a Informação inata que produz a Consciência (vijnana); é a Consciência que produz os Nomes-e-Formas (riamarupa); são os Nomes-e-Formas que produzem os Seis órgãos dos sentidos (sadatyayana); são os Seis órgãos que produzem o Contato (sparsa); é o Contato que produz a Sensação (vedaria); é a Sensação que produz o Desejo (trsna); é o Desejo que produz o Apego (upadana); é o Apego que produz a Existência (bhava); é a Existência que produz o Nascimento (jati); é o Nascimento que produz a Velhice e a Morte (jaramarana).» O remédio para a Velhice e para a Morte é, portanto, a cessação da Ignorância, que equivale à adoção do Buda, da sua Lei (dharma) e da sua Comunidade (samgha).
O samgha cinde-se após um segundo Concílio em Vaisali, dando lugar a um sistema de seitas budistas que examinaremos de seguida.
O imperador Asoka (274/268-236/234), neto de Chandragupta (ca. 320-296), fundador da dinastia dos Maurias, converteu-se ao budismo, tendo enviado missões para a Báctria, Sogdiana e Sri Lanka (Ceilão). O sucesso desta última foi espantoso, dado que os Cingaleses ficaram até hoje budistas. De Bengala ao Sri Lanka, o budismo conquista os países da Indochina e as ilhas da Indonésia (século I d. C). Por Caxemira e pelo Irão oriental, o budismo propaga-se na Ásia central e China (século I d. C), da China para a Coreia (372 d. C), da Coreia ao Japão (552 ou 538 d. C). Implanta-se no Tibete no século VII d. C.
De 100 a 250 d. C, desenvolve-se uma nova forma de budismo que tem como objetivo criar um meio de libertação superior às doutrinas do passado. É por essa razão que ele se proclama Mahayana, «Grande Veículo», por contraste com o budismo anterior, que recebe a designação de Hnayana ou Pequeno Veículo. Ligeiramente desdenhoso na sua origem, este termo pode ser incluído na cronologia e taxinomia do budismo, na condição de se lhe retirar todo o sentido pejorativo. O processo de formação do Mahayana não é inteiramente conhecido, mas uma etapa intermédia (por volta de 100 d. C.) leva-nos até documentos importantes. Sensivelmente no século VII d. C, o Mahayana perde a sua vitalidade. Será suplantado pelo budismo tântrico, do qual o Vajrayana, ou Veículo de Diamante, é uma variante. O tantrismo propaga-se muito cedo na China (716 d. C).
O Mahayana e o Vajrayana são ensinados nos centros universitários indianos sendo os mais importantes Nalanda e Vikramasila. Quando estes forem destruídos, em 1197 e 1203, pelos conquistadores turcos, o budismo desaparecerá praticamente da Índia. E impossível explicar o seu desaparecimento ante o islão, quando o hinduísmo e o jainismo resistiram. Mas, tal como o budismo tinha sido hinduizado, o hinduísmo teria assimilado um grande número de ideias e práticas budistas. [Eliade e Couliano]