Âtman

ALMAÂTMAN E JIVA

Por uma questão de grafia na transliteração do termo sânscrito por diferentes autores citados, mantemos duas páginas distintas, uma para Atma e outra para Atman, trata-se aqui de um único termo sânscrito.

Les Notions philosophiques

Sânscrito, substantivo masculino

Excertos de “Les Notions philosophiques”. PUF, 1990.

  • O sentido primeiro de âtman é “sopro”. No Rig-Veda este termo está frequentemente associado a palavras que significam “vento”; por exemplo é dito que o vento é o âtman, o sopro dos deuses. Esta acepção concorda com a etimologia geralmente admitida que faz corresponder âtman com o alemão Atem. Mas a doutrina dos sopros que desempenhará um grande papel no pensamento indiano, opera sobretudo sobre termos derivados da raiz AN-, “soprar” (assim prana, udana, vyana, etc.). Âtman, por seu lado vai conhecer uma dupla evolução semântica:
    • desde o Rig-Veda é empregado no sentido de “princípio vital”: elemento essencial, mas entre outros, do que constitui o organismo. A etapa seguinte foi fazer do âtman a soma de todos estes elementos, embora desde o Rig-Veda se note que o âtman é aquilo que anima, governa e engloba os elementos constitutivos da pessoa.
    • Se afirma também desde os textos mais antigos o emprego de âtman como pronome reflexivo: “eu me vejo” se diz em védico “eu vejo (meu) âtman”. assim o âtman é para cada pessoa seu “si”.
  • A convergência destas acepções explica outra acepção tardia: o âtman designa o corpo enquanto parte central e essencial do indivíduo, por oposição aos membros e mais geralmente a todas as partes destacáveis. Assim âtman se aproxima de tanu, “corpo”, termo em outros contextos antônimos.
  • Evolui como tema especial da especulação a ideia de um âtman do cosmos, enquanto aspecto do Brahman, e que o âtman de cada indivíduo humano corresponde de alguma maneira ao âtman universal que se confunde com ele. Esta ideia será desenvolvida nos Upanixades.

René Guénon

DISTINÇÃO FUNDAMENTAL DO «SI MESMO» E DO «EU»

Atma penetra todas as coisas, que são como suas modificações acidentais, e que, seguindo a expressão de Ramanuja, “constituem de certa forma seu corpo (esse termo deve ser entendido aqui em sentido puramente analógico), quer sejam de natureza inteligente ou não-inteligente”, ou seja, segundo as concepções ocidentais, “mentais” assim como “materiais”, pois isso, não exprimindo senão uma diversidade de condições na manifestação, não faz qualquer diferença a respeito do princípio incondicionado e não-manifestado. Este, com efeito, é o “Supremo Si Mesmo” (é a tradução literal de Paramatma) de tudo o que existe, sob qualquer modo que seja, e ele permanece sempre “o mesmo” através da multiplicidade indefinida dos graus da Existência, entendida no sentido universal, assim como para além da Existência, quer dizer dentro da não-manifestação principial.

O “Si Mesmo”, até para um ser qualquer, é idêntico em realidade a Atma, posto que ele está essencialmente além de toda distinção e de toda particularização; é por isso que, em sânscrito, a mesma palavra atman, nos casos outros que não o nominativo, toma o lugar do pronome reflexivo “si mesmo”. O “Si Mesmo”, portanto, só é distinto de Atma se o visa de modo particular e “distintivamente” em relação a um ser e, mais precisamente, em relação a um certo estado definido deste ser, tal como o estado humano, e somente enquanto se o considera sob esse ponto de vista especializado e restrito. Nesse caso, de resto, não é que o “Si Mesmo” se torne efetivamente distinto de Atma seja lá de que modo for, pois ele não pode ser “outro do que si mesmo”, e ele não poderia ser afetado pelo ponto de vista a partir do qual se o encare, assim como por qualquer outra contingência. O que é preciso frisar, é que, na medida mesma em que fazemos esta distinção, distancia-se da consideração direta do “Si Mesmo” para considerar apenas seu reflexo na individualidade humana, ou em qualquer outro estado do ser, pois é evidente que, diante do “Si Mesmo”, todos os estados de manifestação são rigorosamente equivalentes e podem ser encarados do mesmo modo; mas, presentemente, é a individualidade humana que nos concerne de modo mais particular. Este reflexo de que falamos determina o que se pode chamar de centro dessa individualidade; mas, se o se isola de seu princípio, ou seja do “Si Mesmo”, ele só terá uma existência ilusória, pois é do princípio que ele tira toda sua realidade, e ele não possui efetivamente essa realidade senão por sua participação na natureza do “Si Mesmo”, ou seja na medida em que se identifica a ele por universalização.

Contemplatio

(extinto site tradicionalista)

Âtman é o Ser de tudo mas especialmente do ser humano em toda tradição filosófica védica. Se traduz como ser individual nos contextos em que está relacionado o termo com o ser vivente, Jiva. Mas o Jiva inclui as envolturas vitais e mentais e o ser puro não. No entanto, em muitas ocasiões se emprega a mesma palavra âtman. Quando o conceito se refere ao real, ao essencial no ser humano, o ser âtman não é distinto de Brahman, o Ser Absoluto. Em espanhol se empregou sempre a maiúscula para distinguir o Ser idêntico ao absoluto do ser com as limitações adicionadas na condição humana. O Ser puro limitado pela mente aparece como um ser separado consciente. A entidade aparentemente unitária se toma pelo “real” durante a existência temporal. Isto é assim até o descobrimento da identidade entre o Ser e o Absoluto. Enquanto o ser humano em evolução é o ser individual que transmigra, do que se ocupa Sankara em algumas passagens.

Heinrich Zimmer

Excertos de “Filosofias de la India”.

La principal finalidad del pensamiento indio es develar e integrar en la conciencia lo que ha sido resistido y ocultado por las fuerzas de la vida; no explorar y describir el mundo visible. La suprema y característica hazaña de la mentalidad brahmánica ( y ello ha sido decisivo no solo para el desarrollo de la filosofía india sino también para la historia de la civilización india) fue el descubrimiento del Yo (âtman) como entidad independiente e imperecedera, en la que se basa la personalidad consciente y la estructura corporal. Todo lo que normalmente conocemos y expresamos acerca de nosotros pertenece a la esfera del cambio, la esfera del tiempo y del espacio; pero este Yo (âtman) no cambia nunca, está más allá del tiempo, del espacio, del reticular velo causal, de la medida y de la vista. Durante millares de años la filosofía india se ha esforzado por conocer este diamantino Yo y hacer efectivo ese conocimiento en la vida humana. Y a esta perdurable preocupación se debe la extraordinaria calma matutina que penetra las terribles historias del mundo oriental, historias no menos tremendas ni menos horripilantes que las nuestras. A través de las vicisitudes de los cambios físicos se mantiene una base espiritual en el campo de la bienaventurada paz del âtman: el Ser eterno, intemporal e imperecedero.

Índia e China