Como vimos, o absoluto é a luz da consciência (prakāśa) porque torna todas as coisas manifestas ao brilhar em sua forma universal. Os fenômenos que aparecem no campo da consciência são experimentados diretamente dessa forma no instante inicial da percepção, quando ainda estão em harmonia com o sujeito que percebe. A luz da consciência é, em si mesma, essa experiência direta, antes que os construtos do pensamento se interponham entre o sujeito e o objeto, degradando este último ao nível da objetividade, o que obscurece a luz da percepção imediata do sujeito. Mas, embora a luz da consciência explique o surgimento dos fenômenos dessa forma, ela não explica totalmente, por si só, a nossa experiência deles. Nenhuma experiência é possível sem o ser/estar-ciente-de-si. A experiência deve ser pessoal para ser, de fato, uma experiência. Como sugere Jung:
A experiência não é possível sem reflexão, porque a experiência é um processo de assimilação sem o qual não poderia haver compreensão.
Do ponto de vista do Xivaísmo de Caxemira, essa reflexão é uma consciência das imagens que aparecem no espelho da Luz. Para que os processos psico-cósmicos que ocorrem no nível da consciência universal (samvid) sejam acessíveis à experiência, a consciência deve refletir (literalmente “dobrar-se para trás”) sobre si mesma para conhecer a si mesma e o que aparece dentro dela:
O Senhor Supremo traz dentro de Si o reflexo do universo e o [reflexo] é Sua natureza como todas as coisas. Ele também não é inconsciente de Sua natureza como tal, porque aquilo que é consciente necessariamente reflete sobre si mesmo.
Esse ato de consciência reflexiva é chamado de “vimarśa”. A palavra é derivada da raiz “mrś”, que significa tocar, sentir, entender, perceber, refletir ou examinar. Assim, “vimarśa” é o poder da consciência em virtude do qual pode entender ou perceber a si mesma, sentir, refletir e examinar os eventos que ocorrem dentro dela — em resumo, comportar-se como um ser vivo ilimitado. Essa capacidade de refletir sobre si mesma é inerente à própria natureza da luz da consciência; de fato, é sua característica mais específica e a própria vida de sua natureza senciente. Sem a percepção reflexiva, a luz da consciência não passaria de mera aparição de fenômenos desconhecidos para qualquer pessoa, como a luz que brilha refletida em um espelho ou cristal comum.
Por meio desse ser/estar-ciente, a Luz sabe que é a única realidade e, portanto, repousa em si mesma, mas não como um objeto autoconfinado e sem vida. Desfruta de perfeita liberdade e está satisfeita (caritārtha) com o conhecimento de que é tudo o que existe, seja sujeito, objeto ou meio de conhecimento. Ser/estar-ciente-de-si é onisciência de Deus, a plenitude (pūrnatā) da consciência toda-abrangente, sua bem-aventurança (ānanda) ou arrebatamento estético (camatkāra) que contém em si a infinita variedade de coisas. Como tal, é a pulsação da contemplação pura, a atividade interna do poder de ação do absoluto (kriyāśakti); nela, todos os poderes do absoluto se fundem para formar a consciência do “eu” incriado (ahaṃ), cuja vibração radiante (sphuraṇa) se manifesta como a forma, a emanação e a reabsorção do universo. Ao contemplar sua própria natureza, a consciência assume a forma de todos os planos da existência, desde o mais sutil até o mais grosseiro. O poder da reflexão é, portanto, a liberdade criativa inerente da luz da consciência para se voltar para dentro de si mesma, introspectivamente, e se libertar de suas formas externas, ou sair de si mesma para ver suas manifestações externas. Em harmonia com a oscilação da consciência entre essas polaridades, o universo da manifestação é incessantemente renovado e é a essência da vitalidade de sua pulsação. A vibração da consciência serve, em suma, para explicar a manifestação dos fenômenos sem causa material ou mudança essencial na consciência, e distingue a Luz como um princípio primário e sem causa de suas criações.