A autogeração divina, que tende à Verselbständigung [Individuação], também é chamada por Baader de “o centro da Natureza”, e é um momento passivo representado como um triângulo — uma figura do princípio feminino da raiz — inscrito em uma circunferência. Uma vez que todo nascimento é acompanhado pelo perigo de não passar incólume pelo fogo do Centro da Natureza (um perigo frequentemente descrito por Baader como periculum vitae), o nascimento do Filho é acompanhado por uma potencialização da inflamabilidade da natureza feminina; esse apaziguamento não atesta a extinção do desejo-apetite inicial, mas sua transformação em realização e alegria; a matriz encontra sua plenitude, enquanto o Pai, vendo uma forma dada à sua expansão, desfruta de uma paz sabática. O Filho, ou a realidade da fundação, representa o relacionamento correto entre o Pai e a Mãe, as forças produtivas.
Podemos colocar aqui uma imagem frequentemente representada nos textos de Baader, a dos três círculos concêntricos geralmente evocados pelas palavras: pater in filio, filius in matre. Não há nenhum ser, diz ele, depois de Saint-Martin, cuja tarefa não seja gerar seu próprio pai. Lidia P. Xella lança luz sobre essa proposição, aparentemente inspirando-se no quaternário segundo C. G. Jung. Essa comentarista de Baader traz implicitamente à tona uma diferença notável entre Baader e Boehme, pois sabemos que para Boehme Sophia não é um quarto termo. É a estrutura quaternária andrógina e ontológica mencionada acima; de fato, por meio do surgimento do Filho, a tintura masculina latente na passividade feminina é atualizada (também se pode dizer que o Filho é formado no e pelo útero despertado para a atividade); ele produz o Pai, mas é o aspecto passivo do Pai que é atualizado aqui. O Filho é uma tintura feminina passiva em relação ao Pai, mas uma tintura masculina ativa em relação à Mãe, de modo que seu duplo aspecto é a mediação, a possibilidade de realizar a quaternidade do Si, a Verselbständigung. O Filho evita que a Mãe seja uma matriz passiva em relação ao Pai, e que o Pai se condene, ao se recusar a se rebaixar, a ser incapaz de apaziguar seu fogo, a se autoconsumir. Como tal, a matriz é indistinta, sem ser para si mesma, sem personalidade própria, capaz apenas de oferecer a si mesma, enquanto o Pai é ativo-passivo e o Filho passivo-ativo, que acima do Ungrund determinam a si mesmos, constantemente entrando e saindo um do outro em um movimento dinâmico; essa determinação é o Espírito, seu movimento é contido pela Mãe que, da potencialidade da matriz, tornou-se o locus do processo de geração, o quarto termo (nem criador nem criado), ou seja, Sophia. São Bernardo, lembra Baader, chama o Espírito Santo de “o beijo do Pai e do Filho”, porque aqueles que se beijam respiram juntos, e a união destas duas respirações cria algo que, por sua vez, age sobre elas. São Bernardo também chama o alento de beijo daquele que respira. O beijo é um tipo de Espírito santificador que reconstitui a tríade primitiva. O Pai e o Filho são ativos ao soprar o Espírito e passivos ao sofrer sua ação. Da mesma forma, o fogo abraça a água, a água abraça o fogo, e sua união é Mercúrio, ou seja, o andrógino que desperta ambos. Deve-se notar, no entanto, que em Boehme esse concurso entre valores masculinos e femininos é concebido apenas no nível da manifestação divina, e não no do Ungrund; não há a menor dualidade no Absoluto que é o Ungrund boehmeano — algo que Baader, que eu saiba, nunca enfatiza.
Pater in filio, filius in matre acrescenta, assim, mais um elemento de androginia ao aspecto andrógino já sugerido pelo duplo movimento; essa expressão-chave significa que o produtor está tanto em seu produto quanto o produto está no produtor, que se centraliza ao produzir, se estende ao mesmo tempo em que se agarra, e isso em virtude do princípio mencionado acima (centrar anda de mãos dadas com o ex-centrar). Por seu aspecto paterno, preenche, confere ou realiza uma interioridade, anima, corporifica (beleihen); por seu aspecto materno, dá forma ou vestimenta, revela, derrama. Dizer “pater in filio” é reconhecer que Deus se manifesta por meio de seu genitus, como os pais por meio de seus filhos. Pai, Deus quer possuir seu genitus; mãe, ele quer ser possuído por ele, o que exprime a dupla atividade: dar plenitude (Fülle) e dar forma ou vestimenta (Hülle). A imagem do fogo, por exemplo, a de uma lâmpada, nos ajuda a entender isso concretamente: o fogo, uma atividade animadora, oferece sua base, seu elemento obscuro, a uma atividade edificante e organizadora, a luz, que ocultará o fogo. Esse fogo (calor ou o Pai) deve ser ocultado para que ocorra a manifestação (luz, o Filho). Mas esse processo é possível graças à presença de um mediador, em nossa natureza elementar, o sol, que centraliza a luz e o calor, assim como Cristo faz em outro plano; esse terceiro termo impede a separação anormal (por exemplo, separar, em nossas vidas, nosso cérebro — a luz que dá forma — de nosso coração — o calor que preenche). O pai une, assim, seu poder ígneo e severo com seu suave poder luminoso (Sophia, Ideia) para engendrar seu Filho, para “fixá-lo” (fassen), para dotá-lo do poder severo do Pai enquanto o envolve com o suave poder chamado por São Paulo de “Mãe eterna nas alturas” (mas em Boehme não é o Pai que “fixa” o Filho, é o Pai que se “fixa” no Filho…). Essa produção de genitus não é emanativa, criatural, ligada ao tempo, mas imanente. Se tivermos entendido a noção de andrógino, escreve Baader, “não veremos apenas no Pai o poder frutificador, engendrador (Potenz), que seria como que separado do poder receptivo — aquele que dá à luz; não veremos nele um macho comparável ao que resultou da separação dos sexos, e não hesitaremos em falar de genitrix em relação a Deus, sem contradizer o dogma.
Pater in filio, filius in matre também expressa “a lei geral de toda manifestação de um superior em e por um inferior”, porque toda manifestação só é possível “graças a uma ocultação livre ou forçada do inferior em relação ao superior”. Além disso, “toda coordenação é uma sujeição recíproca”, “toda sujeição é uma ocultação”, ou ainda: “toda manifestação é condicionada por uma ocultação, toda exteriorização por uma interiorização” — assim como “toda luz é condicionada por uma sombra, toda revelação por um segredo, toda atividade livre por uma paralisação e subordinação de uma atividade”. Isso também significa dizer que todo ser só pode vir à existência por meio da aniquilação de outro ser, como diz Mestre Eckhart ao falar do Pai que se consome no Filho, ou do produtor no produto. Todo produtor se inflama e, ao consumir a escuridão, gera luz. Criar é primeiro fazer um esforço para provocar resistência dentro de si mesmo e depois reduzir essa resistência para se estabelecer. O fogo se eleva na escuridão e se abaixa na luz; é “pai” na medida em que consome a escuridão e “mãe” na medida em que se abaixa na forma de luz. O filho se manifesta na mãe, e o pai, no filho. E, da mesma forma, não há domínio sem servidão ou obediência, não há linguagem sem audição, não há conhecimento sem crença. Por fim, pater in filio, filius in matre, também nos lembra que o produtor está dentro do produto, de modo que, quando vemos o último, também vemos o primeiro (quem vê o Filho vê o Pai); o produto também está no produtor, pois quem vê o Filho o vê na Mãe.