Excertos do prefácio de Roberto Ahmad Cattani, de sua tradução da ALQUIMIA DA FELICIDADE PERFEITA
A escola chamada wahdat al-wujud, da “Unicidade da Realidade”, fundada por Ibn Arabi, afirma a unidade transcendente do Ser. Escreve Ibn Arabi no Risâlat al-ahadiyah (Tratado da Unidade): “Ninguém O vê a não ser Ele mesmo — nem profeta, nem enviado, nem santo perfeito, nem anjo algum podem conhecê-Lo. Seu Profeta é Ele, e Seu Enviado é Ele, e Sua Palavra é Ele. Ele enviou Ele próprio com Si mesmo para Si”.
A escola wahdat al-wujud via na criação uma teofania (tajalli). Os arquétipos de todas as coisas são aspectos dos Nomes e das Qualidades de Deus e existem em estado latente no Intelecto divino. Deus lhes dá existência manifestando-os, mas o que vemos no mundo sensível não é nada mais do que a sombra dos arquétipos (note-se o paralelismo com as “sombras” da Caverna de Platão). A wahdat al-wujud classifica como fundamentais quatro Pilares (arkan) ou Atributos divinos: Vontade, Conhecimento, Poder e Fala; e acrescenta mais três (Vida, Generosidade e Equidade) para formar os “sete principais”, que se juntam para formar o nome Allah, o Nome Todo-Compreensivo (al-ism al-jâmi’) que representa a Essência divina. Destes sete derivam todos os demais Nomes e Atributos divinos.
Partindo da afirmação de unicidade de Deus, o La ilaha illa ‘Llah, não há divindade a não ser Deus, a escola afirma: “Não há realidade, não há beleza, não há poder, que não sejam a realidade, a beleza, o poder absolutos”. Esta fé “primordial”, fonte de toda metafísica muçulmana, proclama a inanidade dos seres criados perante o Infinito e integra o individual no universal. Para a escola de Ibn Arabi, o objetivo da metafísica é chegar ao conhecimento da unicidade divina, assim como o intento da cosmologia é afirmar a unicidade da existência.
Para Ibn Arabi, a criação e a existência do mundo e dos seres nascem da Compaixão (ar-rahmah) de Deus: a Compaixão é a base do Ser, o princípio da manifestação.1 No Futuhât al-makkiyah, Ibn Arabi afirma que o “sopro expirado pelo Compadecido” equivale à “concessão da existência”.2 “É por isto que os sufis dizem que cada átomo do universo é uma ‘teofania’ do Ser divino”, escreve S.H. Nasr. E cada ser, cada átomo, “cada espécie, tudo que está no mundo criado caminha para seu próprio fim, pois o objetivo de todas as coisas é a perfeição. A realização da viagem até Deus não é exclusividade do homem”.3 A viagem até Deus em vida é o tema central deste livro.
Ibn Arabi: Sabedoria dos Profetas
Toshihiko Izutsu: UNICIDADE DA EXISTÊNCIA
NOTAS: